quarta-feira, 28 de dezembro de 2016

Seis músicas para se ouvir na junkebox do bar neste fim de ano

O ano está chegando ao fim. E este escriba vagabundo, frequentador dos bares goianienses e pontagrossenses, preparou uma pequena lista com as seis músicas obrigatórias para se ouvir entorpecido e, de preferência, quando o álcool tiver correndo nas veias, lá pelas tantas da boemia.

Qual bêbado nunca chamou o garçom na mesa e destilou suas lamúrias amorosas? Ou soltou as piadas mais sórdidas para o cara do caixa? Se você é daqueles que integram o grupo dos politicamente corretos, há algo erradíssimo contigo e aconselho uma vistoria delicada em teus mandamentos bebum.  

Mas, amigo cervejeiro, se você espera canções no idioma do tio-sam, desista deste texto solitário e bêbado. No boteco da esquina, ninguém lhe contemplará ao pôr Pink Floyd, tampouco Beatles. É mandamento: Floyd numa junkebox é demonstrar toda sua petulância e insensibilidade lírica e alcoólica, e Beatles funciona em outros momentos, menos durante o furor etílico.

Vamos lá, porque a cerveja logo vai esquentar e eu preciso molhar a palavra.

1 – Desejo de amar – Crystian e Ralf

É indispensável, sobretudo se o sujeito tem a imagem da moça gravada no inconsciente. “Esse seu corpo/Me deixa doente/ Quando passa por mim”. Não precisa dizer mais nada.

2 – Toda mulher – Wando

Do rei das calcinhas. Só quem já colecionou a vestimenta mais íntima das mulheres e se derrete pelo jeito delas vai se identificar com a letra. Viva o eterno porta-voz dos biriteiros e putos deste país.

3 – Cerveja – Leandro e Leonardo

“Hoje é sexta-feira/Caia na cerveja”. Indispensável após aquele dia infernal na firma. A música fala por si só, e qualquer tentativa barata de explicar o som dos goianos e criticas pseudo-intelectuais não funcionarão. Entendeu?

4 –Naquela mesa – Nelson Gonçalves

Difícil escolher uma deste cara, todavia estes versos são aos boêmios de carteirinha: “Boemia, aqui me tens de regresso/E suplicante te peço a minha nova inscrição./ Voltei pra rever os amigos que um dia/ Eu deixei a chorar de alegria”.

5 - Vai trabalhar, vagabundo – Chico Buarque

Trilha sonora do clássico filme de 1972, estrelado por Hugo Carvana, Paulo César Pereio e Nelson Xavier. A fita conta a história de dois jogadores de sinuca aposentados (Pereio e Xavier), que se enfrentam numa partida final, e um malandro (Carvana), responsável por induzi-los ao confronto. Chico Buarque compôs a música de abertura do filme.

6 – Mil e uma noite de amor – Pepeu Gomes

Fundador dos Novos Baianos, Pepeu Gomes compôs este clássico no início dos anos 80. Imediatamente, a música se tornou um hit e foi tocada nas rádios pelo Brasil. “Não me engana/Vem beleza humana/Fica ao meu lado/Preciso de amor”. No começo da bebedeira, Mil e uma noites de amor é essencial.

Sentiu falta de alguma música? Deixe-a nos comentários.

sábado, 17 de dezembro de 2016

O ano da escuridão, da falta de lirismo e dos preceitos neoliberais

Tento escrever uma daquelas crônicas do louco amor, mas 2016 me surpreende com alguma notícia esdrúxula e eu sou obrigado a deixar de lado o lirismo baudelairiano.

É preciso falar dos feios, dos sujos, dos marginais que morrem antes dos inacreditáveis 49 anos de contribuição para patrões tão ensandecidos tanto o general Médici, nos tortuosos anos de chumbo.

Você aí, amigo, não se faça de frio ou desentendido, não me venha com esse papo de fazer reforma sem tocar nos bolsos dos ricos. Assim é fácil, ora pois, assim vira manchete nos jornalões, assim os banqueiros continuam assaltando a população com aplausos calorosos dos comentaristas dos telejornalões.

Rasgue teu carnê da dívida externa. O FMI tem muita grana, e não está nem um pouco preocupado com o bem-estar da galera dos países subdesenvolvidos, ou o dito capitalismo periférico, do qual o Brasil faz parte.

Cuidado com o discurso dos partidos políticos que sustentam a política institucional tão viciada quanto Keith Richards, o mítico guitarrista dos Rolling Stones. Cuidado com o lead do Cidadão Kane, digo, da família Marinho. Cuidado com a retórica fajuta dos Jabores da vida.

Cuidado, porra.

Quê é isso, seu cronista? Quanto palavrão nesta tua verborragia vazia.

É, a coisa está feia mesmo, raro leitor. E não é de hoje. É desde a Proclamação da República, em 1889. 

De lá para cá, foram golpes atrás de golpe. Cretinos histéricos por poder não soltaram o osso jamais. E, há uns meses, o estranhamente ridículo Michael Temer, brindado por seus mesóclises, está sentado na cadeira do Palácio do Planalto.

Negras tormentas não nos deixam ver, com diz a música Las Barricadas.

Ah, tá, não devemos nos esquecer da agenda econômica que bebe nos preceitos neoliberal da Escola de Chicago. Os neoliberais, vale frisar, não esquentam a cabeça com "assistencialismo barato". 

Tudo vendido página a página, coluna a coluna. Assim se constrói a narrativa do enredo golpista.

Que ano foda foi 2016, hein.

Primeiro Bowie e depois Gullar.

Fora os tantos outros gênios que nos deixaram, e fizeram de 2016 um ano norteado pela escuridão.

Mas algumas pessoas entram em nossas vidas, e a gente esquece o enredo golpista, o levante reacionário dos cretinos que são citados na lava-jato, o discurso de ódio, a falta de amor, de empatia, de compaixão.

A gente esquece, ainda bem, porque há abraços e beijos e prazeres, de pessoas tipicamente da geração do amor.

Que 2017 seja cheio de amor, paz e lirismo debochado e desenfreado.

quarta-feira, 14 de dezembro de 2016

Sussurros, gemidos contidos e sacanagens ao pé do ouvido

Não restam mais dúvidas: quanto mais beira o irreal, com gritos à noite toda, como se vê e se ouve na tela do cinemão pornô, mais interpretativo, digo, fingido é o tal do orgasmo.

A gente se mata, pinga suor pelo corpo todo, mas não adianta: os gritos da moça nunca são condizentes com a nossa performance que mais parece ter saído das páginas de Mulheres, do dirty old man, Bukowski, bêbado numa madrugada californiana.

Não é à toa que os melhores orgasmos guardam um preceito educacional nos gemidos, como Jane Birkin, em Je taime moi non plus, do feioso Serge Gainsburg, a melhor música pra se ouvir durante a copulação.

Una canción muy bella, mi amigo.

Este lesado e medíocre cronista de costumes que vos escreve já passou por situações em que a moça por pouco não rachou as paredes do quarto. Todavia, estávamos no ímpeto sexual, com ela mordendo levemente a boca e eu encarando seus olhos, e nada parecia ter importância nessa porra.

Mas quando a tua moça lhe gritar durante a hora agá, desconfie. Esta gritaria toda só serve para causar inveja no casal do apartamento de cima, que não se dedica a arte milenar do amor há uns dez, quinze anos.

Incrivelmente, os gritos só costumar ocorrer quando o gozo não passa de truque, o tal melodrama das mulheres – que elas desempenham com assombrosa facilidade, inclusive.

O gozo desesperado, barulhento e fantasmagórico costuma ter origens remotas, como me soprou o pai do amor livre, doutor Reich. O gozo desesperado, barulhento e fantasmagórico costuma ter origens em alguma interpretação estranhamente equivocada dos manuais do Actors Studios.

Agora, meu ilustre leitor, os melhores orgasmos vêm das moças contidas no gemido, das que puxam a cabeleira do amante e lhe dizem alguma sacanagem ao pé do ouvido, das que contorcem a musculatura e depois dão um beijo caloroso na boca do amado, pois como dizia o Nelsão Rodrigues: “sem dentadas, não há amor”.

Uma coisa é a gritaria que mais se parece com alguma produção da Brasileirinhas, que pode fazer um edifício pegar chamas ou algo do gênero. Outra, muito, muito melhor é a gemedeira delicada, gostosa, lirismo corporal, decassílabo orgástico, a asma do amor, dos corpos, a falta de fôlego, a respiração acelerada, Jesus!

sábado, 10 de dezembro de 2016

Sem sujeirinhas não há tesão



É cerveja sem álcool, almoço sem carne, doce sem açúcar, café sem cafeína, conversas virtuais a cara-a-cara, massa sem glúten. O que era com ficou sem.

Até aí tudo bem, o mundo está ficando saudável e limpinho mesmo. É consequência da pós-modernidade.

Mas peraí. As loucuras de bem-estar são aceitáveis, compreensíveis e proporcionam longevidade. Afinal de contas, a gente tem medo de apertar o paletó de madeira. É um sentimento legítimo desde a antiguidade clássica.

O que não dá é sexo sem cheiro. Não dá! Pare o mundo eu quero descer, como canta Raul, em Também vou reclamar.

E o pior é que este insulto ganha cada vez mais adeptos que não tem medo de propagá-lo nas mesas dos bares.

Todavia, o cúmulo mesmo é ouvir nas espeluncas underground que rola até perfume no pau, meus caros.

Atualmente, os caras transam e vão correndo para o banheiro. Homens-flexas da assepsia, como diz Xico Sá. Nem encostam a cabeça da moça no lado esquerdo do peito para uma conversa pós-coito – um dos maiores prazeres da humanidade.

Trepar e não sentir o cheiro é como vir à vida e não gozar dos cinco sentidos que você trouxe do berço.

É ignorar um dos ensinamentos de Henry Miller, em A crucificação encarnada, que ilustra este post. Recomendo toda a trilogia aos machos limpinhos, inclusive.

E a turma do nojinho aos pelos pubianos, o que dizer?

Moças, nada de decepar a mata atlântica lá em baixo por causa de meia dúzia de adolescentes com cabeça poluída por putaria barata.

Depilar faz bem, entendo, mas o que me intriga é essa raspadinha radical. Na hora agá, parece que somos Romam Polanski, diretor de cinema polonês que transou com uma menina de treze anos e foi condenado pela justiça estadunidense.

Cuidado higiênico é excelente, sem dúvida. É o mínimo, meus caros. O que é inaceitável é trepar e ir correndo para o banheiro e eliminar todos os supostos mal-cheiros que a copulação lhe proporciona.

Sujeirinhas e melações caracterizam a arte milenar do amor.

Amar suja.

E viver também.

sexta-feira, 9 de dezembro de 2016

Para as cancerianas, com muito amor

Já tive duas mulheres de Câncer, melhor, duas mulheres de Câncer me tiveram, me dominaram, fizeram gostoso e bonito.

Não falo dessa coisinha broxante cujo status no facebook seria “estamos num relacionamento sério”.

Falo da boa e velha foda, cara, independentemente da temporada no inferno, meu caro Rimbaud.

As duas foram transas convencionais, daquelas que lubrifica o psiquismo, rejuvenesce a vida e revigora o humor. As duas foram do tipo “quero me perder no teu emaranhado, te abraçar o corpo inteiro”, morrer de amor e me perder em tuas curvas. 

Embora meus conhecimentos astrológicos sejam iguais aos de um corintiano sobre seu maior rival, consigo compreender um pouco sobre as cancerianas.

E, amigo leitor, de uns tempos pra cá eu me considero uma espécie de guru do mapa astral.

Vai entender.

Outro dia, até, abri o DM Revista, na sala de aula, e dei uma olhada no horóscopo do dia.

O professor, meio sem entender, soltou:

“Cê tá vendo horóscopo, Beck?”

“Pois é, professor”, respondi. “Quero ver o que esta quarta-feira braba reserva pra mim.”

Evidentemente, o cara deu uma contida gargalhada. Totalmente compreensível, inclusive.

Precisasse yo de uma desculpa intelectual, recorreria aos escritores hermanos, que amam pôr zodíaco no trem, digo, no texto, como Robert Arlt.

Mas não é caso.

Este vira-lata das letras que vos escreve não precisa ir tão longe, afinal é um pouco complicado sensibilizar alguém nestes tempos em que negras tormentas não nos deixam ver, nem ouvir, nem sentir, nem pensar, levando-nos ao enredo de Por quem os sinos dobram, de Hemingway.

O amigo cético aqui, paranaense dos campos-gerais, ilustre frequentador das espeluncas underground da noite goianiense, numa roda de saias por aí, ouviu de uma amiga, canceriana:

“Não aguento minha carência”.

“Por quê?”, perguntei, no alto de minha habitual leseira.

“Porque me sinto um pouco vulnerável.”

Que nada! As cancerianas são carinhosas, e carregam consigo uma carga dramática extremamente sensual, daquelas que deixariam o fodão do Henry Miller embasbacado.

Sim, eu gosto de te ver, canceriana. Com fome, então, a energia orgástica pode acender um cigarro sem isqueiro, enquanto Something sai no som.

Nunca tenha o desleixo de deixar uma canceriana magoada. Pode ser a tua única e última vez. Dê atenção, converse, respeite-a, abrace-a. Se conseguir, cite alguns poemas cretinos que lhe vier à cabeça.

Poemas, e não músicas que podem provocar lesões nos tímpanos da moça. E nada dos clichês bukowskianos que extraiu de Mulheres, numa sexta-feira à noite em que estava sem grana e com os sentidos tomados pelo famoso pé na bunda.

Música é tudo, já disse o doutor Hunter Thompson. E as letras são - principalmente a poesia - a linguagem da alma.

Nada como o carinho canceriano.

Eu quero é que você me aqueça nas tuas conchinhas astrais, canceriana! 

domingo, 4 de dezembro de 2016

Esquisitice em carne e osso

Batista Custódio fala ao telefone. Em sua frente há uma Olivetti azul. A máquina está envelhecida de vários textos que foram batidos nela. Batista se encontra entredito na conversa. Deveria ser alguma fonte o ligando, ou ele deveria estar apenas a conversar com algum amigo. Gesticula e tira os óculos. Após alguns minutos, desligou o telefone. Sua secretária, uma loira atraente de olhos verdes, avisou-lhe:

“Esses meninos são estudantes de jornalismo da PUC”, diz e moça.” Eles precisam colher algumas informações do senhor. Tudo bem?”, completa.

Com feição fria, Batista brada:

“Quem são seus os professores? O que eles fazem? Eles são jornalistas?”

Um silêncio pairou sobre a áurea da sala. Todos se olhavam. Ninguém sabia o que falar, e nem como falar. Batista aparenta ser o dono da razão acima de qualquer coisa. Quaisquer indícios de contrariedade, ele dispensa veementemente. Na conversa, citou livros e deixou bem clara sua visão de mundo. E, quando se deparou com algum questionamento, bufou. “Jornalista é guerreiro, poeta, humorista e apócrifo, porque dependendo da matéria que for escrita, você fará o seu leitor rir ou chorar”, afirma, logo de cara, gesticulando e dando leves pancadas em sua mesa.

Com fama de maluco, Batista tentou ser minimamente cordial. Discorreu sobre livros que considera primordiais para se formar um jornalista. Na ótica do diretor do Diário da Manhã, todo profissional da imprensa deve ler contos “para poder conhecer seu estilo” de escrita. Homero, Shakespeare, Dickens, Tolstoi, Victor Hugo e Hemingway são alguns dos autores que o formaram. “Durante cinco minha vida era biblioteca, trabalho e casa”, conta.

Início da carreira e cinco de março

O diretor do Diário da Manhã começou no jornalismo em 1952. Mas a época de maior destaque em sua carreira foi na década de 1970. Neste período, Batista dirigia o semanário Cinco de Março, que era opositor a ditadura militar. O veículo fora fundado em 1959. Batista tinha apenas 23 anos. À época, ele comandara uma série de reinvindicações da União Goiana dos Estudantes Secundaristas que, além dele, faziam parte Javier Godinho e Telmo Faria.

Na década de 1960, o Cinco de Março assumira uma postura crítica e essencialmente opinativa. Todavia, em 1969, quando o AI-5 fora aprovado, o jornal passou a fazer reportagens com cunho um pouco mais factual, deixando de lado a fórmula de crítica municipal, estadual e federal. A publicação era altamente panfletária. “Jamais daria certo hoje”, diz seu filho, que não quis se identificar.

Por conta do trabalho opositor, Batista ficara oito meses preso. “Mas não durava muito. Eles me prendiam, depois me soltavam. Exceto uma vez que fiquei preso por oito meses, por crime de opinião”, revela.

Batista fitou os alunos, e perguntou:

“Algum de vocês já foi preso por crime de opinião?”

Novamente, o silêncio imperou.

“Não? Então tá mais do que na hora!”, exclamou, achando o fato de três alunos do primeiro período de jornalismo nunca terem passado uma noite no xilindró um insulto à futura dignidade profissional deles.

Aventura

No Diário da Manhã, nos primórdios da década de 1980, trabalhara com grandes nomes da imprensa. Mino Carta, fundador e diretor de redação da Carta Capital, contribuiu para o jornal. “Peguei um avião aqui e fui para o Rio de Janeiro. Agora, imagine o Mino Carta, que dirigia O Globo, vir trabalhar em Goiás? Tive de convencê-lo.”

Segundo Batista, o Diário da Manhã era para ser um jornal para o Brasil, mas evidentemente ao longo do tempo seu projeto acabou fracassando. “O Brasil vai abrir”, diz ele, em alusão as Diretas Já, “e nós precisamos de um jornal para o Brasil”. Em Goiás, de acordo com o jornalista, os profissionais da imprensa são todos analfabetos e ignorantes. 

“Porra, como que pode um cara que nem saber latim cogitar a hipótese de ser jornalista?”, questiona-se ele.

Mas a experiência com o “jornal para o Brasil” durou pouquíssimo tempo. Após dois anos, o DM faliu pela primeira vez. “Fiquei fechado por 25 anos, sem nem estar fechado. Acredita? Quando reabri, o Estado disse que eu poderia ter uma ajuda. Eu falei que não ajuda porra nenhuma”, afirma.

Para o jornalista Ivanoel Mendes, responsável pelo DM online, Batista Custódio é “um jornalista brilhante, mas um péssimo administrador.” Ele afirma que o diretor representa um período importante na história do jornalismo em Goiás. Na visão de Ivanoel, Batista é bom em apenas uma coisa: ser jornalista.

Espiritismo

Espirita, Batista acredita que o mundo mudará quando a alma dos homens evoluir. No Diário da Manhã, inclusive, há corriqueiramente psicografias de Fábio Nasser, seu filho, que morreu na década de 1990, após entrar em profunda depressão. Nasser fora repórter e editor de política do jornal e, segundo uma professora da PUC, ele gostava de usar entorpecentes.

Em determinado trecho do diálogo, Batista citou o filólogo e filósofo Nietzsche: “Eu gosto da ideia dele, mas ele mudou, se tornou cristão.” Batista afirmou que há escritos que comprovam que o pensador alemão deixou, no final da vida, de ser ateu. Aproveitou ainda para citar uma obra de Getúlio Vargas que, de acordo com ele, também fora psicografada. Neste livro, Vargas falaria o porquê da rixa com Carlos Lacerda. “Lacerda era a encarnação de Marat”, assegurou.

Confrontado sobre a existência de Deus, Batista disse que é inadmissível não se crer nele. Segundo o jornalista, o homem vem ao mundo para sofrer.

Jornalista e literatura

Batista afirma que jornalismo e literatura andam de mãos dadas. “Jornalista tem de levar o leitor aonde ele não pode ir”, aconselha. Jéssica Fernandes, repórter do DM Revista, declarou que Batista é bastante exigente. “Quer que nós escrevamos reportagens com criatividade”, revela.

No final da conversa, Batista demostrou todo o fascínio que nutre por Shakespeare, comparando-o a Machado de Assis e, depois, afirmando que o dramaturgo inglês é totalmente incomparável e único. Mas, para se entender uma narrativa, na visão do diretor, Homero, símbolo da cultura antiga, é fundamental.

Editor do DM Revista, Neil Oliveira disse que todo dia aprende muito com Batista. “Ele é locão. Fala o que vem na cabeça, não têm papas na língua, mas eu aprendo muito com ele”, diz.

Desfecho

Após aproximadamente quatro horas de conversa, os alunos foram embora com uma grande certeza: Batista carrega uma bagagem de mundo peculiar. Leitor voraz, e de clássicos, ele também é fã de música clássica.

Os alunos apertaram as mãos de Batista, e o agradeceram pela entrevista.

Quando eles viravam as costas, o jornalista indaga:

“Sabe por que eu gosto de mulher?”

Todos ficaram lacônicos.

“Porque as feias são obras do diabo, e as bonitas são obras de Deus.”

Batista Custódio é isto: esquisitice em carne e osso.

quarta-feira, 30 de novembro de 2016

Eis que os deuses foram maldosos

Um belo dia a Deusa das quatro linhas resolveu beijar os pés dos maltratados, desprezados, excluídos. E desses pés nasceram vários jogadores, espelho de muitos meninos. Sem muita escolha, vieram abraçados a uma lata de 350 ml de Coca-Cola e com uma bola nos pés.

Mesmo antes de aprenderem a andar, sabiam jogar. Na várzea, davam show. Os amigos, claro, ficavam com raiva e começavam a apelar nas entradas. Mas os meninos, criativos que só eles, conseguiam escapar dos carrinhos maldosos dos amigos, que não foram escolhidos pela Deusa.

A bola os procuravam, os reconheciam. Ela precisava deles. Eles a tratavam com carinho, a chamavam para conversar quando todos pareciam tratá-la com desdém. No peito de seus pés, ela descansava. E se embalava no ritmo de seus gingados e molejos. Eles a davam brilho, a davam voz. E ela falava, e deste diálogo milhões de pessoas eram iluminadas com tamanha beleza.

Mas, na última terça-feira (29), os deuses do futebol resolveram ser cruéis. O avião que transportava a delegação da Chapecoense caiu próximo a Medellín, na Colômbia. A equipe disputaria a final da Copa Sul-Americana, na próxima quarta-feira (30), contra o Atlético Nacional. Pela primeira vez em sua história, os catarinenses chegaram à final de uma competição internacional.

O voo levava aproximadamente 72 passageiros, além de nove tripulantes. Desses, 22 eram profissionais da imprensa. De acordo com o portal Fórum, apenas um jornalista sobreviveu. Os outros seis trabalhavam na Fox Sports, emissora que possui os direitos de transmissão da competição.

A Federação Catarinense de Futebol (FCF) decretou luto de 30 dias por causa do acidente. Ao foram ao menos 76 vítimas, incluindo jogadores da Chapecoense. A tragédia ainda provocou a morte do presidente da Federação, Delfim Pádua Peixoto, que era um dos vice-presidentes da CBF.

“A diretoria da Federação Catarinense de Futebol manifesta pesar interminável aos familiares, amigos, cidadãos chapecoenses, catarinenses, brasileiros e a toda comunidade do futebol mundial pela maior tragédia do esporte brasileiro ocorrida com a delegação da filiada Associação Chapecoense de Futebol”, diz a entidade.

O jornalista Juca Kfouri, em seu blog, afirmou que todos os clubes deveriam doar algum jogador promissor para a Chapecoense. Ele ainda sugeriu que os times entrem em campo, na última rodada, com as cores da equipe catarinense.

Realmente, seria bonito e tocante, Juca. 

terça-feira, 29 de novembro de 2016

7 livros eróticos para se ler nas férias

Porque as férias estão chegando e nada melhor do que uma breve lista de livros eróticos para aquecer seus dias ociosos. Ou, por que não?, para abastecer-lhe com um repertório coerente quando for para o lesco-lesco com a moça. Literatura é a vida combinada, ensinou o realista Gustave Flaubert, autor de Madame de Bovary.

Chega de blá, blá, blá e vamos ao que interessa.

Sexus, de Henry Miller – Fenômeno da revolução do amor livre. Leia a trilogia Crucificação encarnada – Sexus, Nexus e Plexus – e nunca mais, como diz Xico Sá, você vai tirar a roupa do mesmo jeito. Garanto.

Delta Vênus, de Anais Nin – Se o cara aí acima não funcionar, encare uma escritora que foi casada com ele. Anais Nin percebeu que Miller tinha o dom da escrita do cacete, e o colocou no caminho da literatura. Caso se interesse, há um filme “Delírios Eróticos – Henry e June”, que conta o relacionamento dos dois, em Paris, no final da década de 1920. A fita foi baseada no diário pessoal da escritora.

A polaquinha, de Danton Trevisan – Equivocou-se quem sempre achou que o “Vampiro de Curitiba” manda bem apenas no conto. Neste romance, você vai se desfazer de sua convicção de que sabe tudo sobre as safadezas de alguém.

Mulheres, de Charles Bukowski – Clássico do dirty old man. Com este título e o velho safado destilando todo seu dom alcoólico, buceteiro e literário, não precisa dizer mais nada. E para completar: a tradução é de Reinaldo Moraes, autor do genial “Pornopopéia”.

Pornopopéia, de Reinaldo Moraes – Tradutor de gente como William Burroughs, Jean Cocteau e Charles Bukowski, o brazuca Reinaldo Moraes chacoalhou o puritanismo que rege a literatura brasileira. Num texto lírico, zoado e instigante, Zeca, o narrador, conta suas bravatas sexuais, repletas de pó, birita e putaria. Bizarro e indispensável.

Tanto faz, de Reinaldo Moraes – Mais um do Reinaldão. Escrito em Paris, num período em que o próprio autor estava curtindo uma bolsa de estudos, Tanto Faz narra peripécias sexuais, alcóolicas e canábicas de Ricardo, protagonista e uma espécie de alter-ego de Reinaldo. Fundamental.

Bonitinha mas Ordinária ou Otto Lara Resende, de Nelson Rodrigues - sacanagem à brasileira com uma pegada suburbana. Nelsão é obrigatório em qualquer seleção de sacanagem literária do planeta.

E você, raro leitor, do que sentiu falta? Deixe seu comentário.

segunda-feira, 28 de novembro de 2016

O homem, a mulher e a pornografia

Antes de tudo: a pornografia é o erotismo dos outros. Vai que é tua, George Bataille.

Quando nos interessa, a sacanagem é tratada como material puramente erótico, sagrado, bonito e refinado. Se alheio, não passa de mera putaria, para parafrasear Reinaldo Moraes, em Pornopopéia, daquelas que a gente vê aos montes com apenas um clique na internet.

E chega de frescura literária. A não ser, claro, que o amigo insista na leitura de um capítulo da bíblia que deixaria Henry Miller cabisbaixo. Cantares, Cântidos de Salomão ou simplesmente Cântico dos Cânticos.

Esquece, porra.                                                              

Finalmente, vamos à sacanagem propriamente dita. Afinal de contas, essas teorias sobre a diferença entre erotismo e pornografia são de uma frigidez ou de uma paumolescência que deixaria qualquer um com a libido retraída.

Foda hein, tio Reich.

Acabei de descobrir, num exercício de pesquisa para conseguir finalizar esta crônica miserável, que o Brasil e as Filipinas lideram o consumo de vídeos pornôs por parte das mulheres. A pesquisa foi encomendada, pasme, pelos sites especializados “Pornhub” e “Redtube”.

Mas o tesão é tentar entender o barato, mesmo que este cronista bebum e mal-diagramado, apaixonado e escravo das moças nunca chegue sequer nem perto de tal façanha.

Obviamente, o macho é mais visual. Basta um toque para deixá-lo totalmente armado. O cara, na maioria das vezes, sente fetiche com o gozo na boca, com jatos irreais pela face, aquele clichê zoado que ainda não evoluiu desde a selvagem era das produções Buttman.

Se bem que há uns por aí que com apenas um trago num vinho tinto vagabundo e uma bola num beque mais ou menos conseguem jogar a autoestima das damas lá embaixo.

E outros, no ápice da cretinice, não toleram ver uma moça livre e dona de si.  

Falta um Henry Miller, um Bukowski, um Nelsão na vida desses seres desatentos aos sinais femininos. Ah, recomendo, também, a leitura do clássico Ofício de Viver, do Pavese, que cito pela enésima vez neste espaço solitário.

É, vou vagar por ai, amigos, aqui fica o beijo e admiração ao sexo feminino, mas antes teria de firmar Walt Whitman, o poeta que corria atrás dos marinheiros, em Nova Iorque, no século XIX, como testemunha do que tenho doravante a dizer. Com ou sem amor, evidentemente.

Vai lá, Whitman: “Não falta nada, mas faltaria tudo, se faltasse o sexo”.

domingo, 13 de novembro de 2016

Cartilha amorosa

Namorar é bom. Isso é quase tudo que sei sobre o amor. Nunca soube muito bem como me comportar diante da mulher amada – ou qualquer outra mulher que me direcionasse um olhar cintilante e florescente. Os encontros com a dama pretendida eram um trabalho jocoso que transitava entre insegurança e excitação. Do tipo que me fazia pensar: “vou com a minha velha camiseta dos Rolling Stones, ou com uma camisa social que têm os botões todos em plena atividade?”.

Em minha inexperiente cachola de amante aprendiz pululam questões de cunho fervilhante. Por incrível que pareça, sempre surgem dúvidas e perplexidades relacionadas à vestimenta. Quando li Ofício de viver, do Pavese – um misógino doidão que não podia viver sem o charme feminino -, comecei a me atentar pros sinas práticos do corpo delas, como o olhar, por exemplo, a característica e o sinal mais sublime do ser feminino.

Foda mesmo é quando você tá na mesa, a conversa fluindo e, de repente, bate aquele tesão incontrolável. O maço de cigarro vai embora como se fosse a última musica do Let it be. Controlar o desejo sexual, pondero, é uma atitude que requer certa experiência do cara – e alguns diálogos consigo mesmo, digo, com seu desvairado psiquismo.

O que eu devo fazer? Devo cair de boca aqui mesmo? Ou na sala do seu apê, ou do meu apê, que é um lugar sossegado, pois meus velhos estão viajando? Dá pra pitar um du bão e ouvir um The Doors, ou qualquer outro som, cê que manda, gatinha.

Ou, também, a gente pode assistir àquele filme do Godard, sabe? Ah, cê não curte cinema cabeça? É chato, eu sei. Mas podemos, sem problemas, ver uma comédia romântica, estilo Woody Allen. O estilão dele é do caralho, né? Mas vamos evitar os clichês hollywoodianos, que como diz o Jabor, num raro texto em que achei bom, prostituiu Aristóteles, cuja mocinha morre de câncer no final, quando todos os obstáculos do casal pareciam superados.

Esses filmes fazem escorrer algumas lágrimas deste camarada bebum que vos escreve. Outono em Nova Iorque é um desses. Chorei pacas quando o vi. Tava meio bêbado, ainda. Imagine a cena. Dizem que homem que é homem não pode chorar em hipótese alguma. Lorota pra boi-dormir, cara. Homem chora, sim. Outro dia vi o Marcelo Rubens Paiva, numa crônica, falar que chora facilmente. Confesso que ao findar a leitura, senti-me livre como uma criança que joga bola com os amigos, após a aula.

Mas, e depois do filme? Fumaremos um cigarro? Ou vamos direto pro sexo?

Cansei de me perder em questões ridículas como essas. Ao mesmo tempo, intuía, no fundo do meu raso e superficial entendimento dos meandros femininos, que vestir as mais adequadas roupas, adotar rebuscadas maneiras, ver tal e qual filme, ouvir este ou aquele disco, comer neste ou naquele restaurante, beber naquele bar decente ou naquela espelunca, não ia mudar grandes coisas no psicossomatismo da mulher desejada. A química do amor é espetacularmente misteriosa. É um jogo cujo objetivo é ser subjetivo. Deu pra enteder? Porra nenhuma, não. Em todo caso, vale a pena ficar atento as dicas e conversas das amigas mais íntimas.

Dia desses, folheando uma revista feminina na sala de espera do meu médico, topei com uma “consultora sentimental” dando dicas primorosas sobre como um homem deve ser e estar ao lado da dama que ele corteja. A lista, meu amigo, é longa. Deveria tê-la lido alguns anos antes. Evitaria inúmeros transtornos.

Pra começo de conversa, nada de banho de loja antes de encontrar a mina. Nem de negligência indumentária. A regra básica é o meio-termo: arrumadinho, mas sem exibicionismo. E é bom maneirar com os palavrões, porra. Tampouco é recomendável jogar na conversa assuntos cujo entendimento se restringe a quem tem phd em Ciências Sociais, na USP. A puta da realidade fica pra depois – se houver um depois. O papo cabeçudo, quiçá, nem deve ser colocado em pauta, sobre a possibilidade de ela lhe deixar chupando dedo junto de sua dialética marxista.

Até de etiqueta sexual a tal da consultora falava. O recado era basicamente: não vá com sede ao pote, de modo que você deve respeitar o tempo dela, não invente posições que requerem certo malabarismo, não fique bradando sacanagens baratas ao pé do ouvido da moça na hora do lesco-lesco, jamais dispense camisinha, nem diga que é uma lúbrica merda transar com o pau revestido, não a induza a notas positivas sua performance sexual. Não demonstre, jamais, afoiteza em vazar depois da foda. E por aí seguia a preleção da consultora sentimental.

Fiquei, confesso, um pouco deprimido ao ler aquilo tudo, que me soava como um murro bem no meio das minhas convicções machistóides, jorrada, reconheço, aos borbotões na mesa do boteco e, inclusive, saudada e apoiada pelos companheiros de birita.

Por fim, corri os olhos sobre as dicas da consultora, com considerável pressa, pra ver se encontrava alguma coisa em que me sobressaísse.

Achei um, finalmente:

“O homem tem quer ser limpinho, de preferência emanando um discretíssimo perfume masculino à base de madeiras aromáticas.”

Bem, tirando as “madeiras aromáticas”, acho que posso ser considerado, tranquilamente, um cara limpinho. Não dispenso meu básico chuveiro diário. Ainda mais com esse calor surreal que faz em Goiânia. Calor este que deixaria Salvador Dalí cabisbaixo. Agora de uma coisa posso me gabar: as mulheres já me xingaram de tudo e mais um pouco, com e sem razão, mas nunca pintei de fedido. Não que eu tivesse ouvido, pelo menos.

Como cantavam os Beatles: “Something in the way she moves/Attracts me like no other lover”.


sexta-feira, 21 de outubro de 2016

Keroauc, o beat que não desejava ser beat

Escritor desprezava a cultura pop e não queria ser visto como ícone

Jack Keroauc

Ao longo de nove anos, Jean-Louis Lebris de Kerouac, mais conhecido como Jack Keroauc, viajou de Nova Iorque a São Francisco e do México ao Alasca. Quando não estava na estrada, ele passava seus dias com o poeta Allen Ginsberg e com o escritor junkey William Burroughs, autor de Almoço Nu, uma das obras mais importantes da geração beat.

Seus amigos já eram autores famosos nesta época, e Keroauc ainda trabalhava em seu primeiro romance. Pouco tempo depois de lançar On the road, sua oba mais famosa, o autor publicou a novela The subterraneans. Após o lançamento, o texto causou controvérsias pela forma com que relatou os afro-americanos.

Mesmo com todas as críticas que o acompanhavam, o potencial de Keroauc era inegável. Sobre efeitos de benzedrina, ele escreveu The Subterraneans em apenas três dias. Seus textos apresentava uma prosa espontânea, com frases longas, adjetivação empolgada e metáforas bem construídas, sobretudo em On the road.

Refugiado numa cabana nas imediações do Desolation Park, o autor passou dois meses sozinho. Nesse tempo, escreveu 12 novelas, produziu inúmeros haicais e escreveu cartas. De volta a São Francisco, celebrou seu retorno em um clube de jazz, gênero que esteve em sua obra principal.

Geração beat

Considerado um escritor delicado que desprezava a cultura pop, Keroauc é considerado o criador do termo geração beat. Quando On the road foi lançado, nove anos depois de ter escrito o esboço de The Weeks, um trabalho registrado em 36,5 metros de rolo de teletipo, que exigiu densa revisão, acabou sendo leiloado por 2,4 milhões de euros. Em seguida, ele se tornou o autor mais famoso da geração beat.

Na década de 1960, no entanto, Keroauc elegeu a bebida como uma de suas prioridades. E ela o levou a ruína. À época, deu várias entrevistas e provocou má impressão em todas. Declarou que os hippies eram um bando de comunistas. E causou ainda mais espanto quando afirmou que mulheres eram como demônios que deveriam ser mantidas em casa.  Chegou a falar, inclusive, que os negros e judeus eram problemas nacionais. Disse, também, que seu maior sonho era ter sido fuzileiro naval, na Guerra do Vietnã.

Visto como alienado, ele foi à contramão de seus amigos pacifistas, como Allen Ginsberg. Após ser informado que seu amigo, Neal Cassady, que o inspirou a escreveu On the road, se tornou motorista do grupo de escritores Merry Pranksters, Keroauc disse que ele foi sugado pelos hippies e pelo LSD. Cadassy, quando soube da declaração do amigo, afirmou que era triste ver como Keroauc havia desistido de tudo. “Agora ele é apenas um bêbado famoso em seus próprios termos”, frisou Neal.

Vítima de overdose, Neal morreu nas montanhas mexicanas em 4 de fevereiro de 1968. Perto dele havia uma bíblia e cartas antigas de Keroauc e Ginsberg. No mesmo ano, Keroauc finalizou a produção da décima quarta novela biográfica – Vanity Duluz. Na obra, ele recorda que era chamado de Memoru Babe pelks colegas de classe por causa de sua memória privilegiada. “Vivendo novamente em Lowell, sua cidade natal, Keroauc não conseguia se recordar de seus ataques de fúria em decorrência do alcoolismo. Numa noite, ele arremessou uma faca na parede atrás de sua mãe”, relata Steve King.

Morte

Jack Keroauc deixou esse mundo em 21 de outubro de 1969, um ano e sete meses após a morte de Cassady. A causa foi hemorragia gastrointestinal provacada pela cirrose. Mesmo com altos e baixos, ele foi considerado pelo jornal The New York Times como o mais importante escritor moderno desconhecido dos EUA.

“Durante o funeral de Kerouac, o padre escolheu uma passagem bíblica que fala da reflexão de dois discípulos que acompanhavam Jesus até Emaús. ‘Não era como um fogo queimando dentro de nós quando ele falava conosco na estrada?’”, cita King.

quinta-feira, 20 de outubro de 2016

Assim nascem as crônicas

Algumas saem fáceis, como as de Rubem Braga. Outras são um pouco mais difíceis, e a gente tem de suar, digo, passear os dedos pelas teclas, para que a ideia baixe no papel.

Algumas são fáceis como beijos roubados de mulheres difíceis, que nos deixam encabulados, logo nós, homens, seres altamente limitados, cuja vida resume-se a porres no boteco manjado da esquina e comentários mordazes sobre o jogo do Timão.

Algumas, amigo, são crônicas de britadeiras, saem na marra, à força, como se fosse o último cigarro que há em tua carteira de Marlboro. Outras, cara, vão pro papel carregadas de lirismo, mas não podemos esquecer de que algumas, também, estão só o fiapo da narrativa, sem sustança, sem tutano. Aí se tem de apelar pra metalinguagem – a crônica sobre a falta de assunto.

Algumas vem ao mundo pra confundir a audiência, são crônicas-travestidas. Pois é, a gente não tem a mínima ideia se o troço é conto, crônica, ou poema em prosa.

Algumas não têm jeito, não. Ah, elas eram apenas notícia, mas aí vai um tal de Moacyr Silar e as transforma naquele texto precioso, que brilha como a lua numa rua deserta.
Algumas são de costumes, e até ficam como registro histórico, como as do João do Rio – já ouviu falar?

Algumas são aliterações. Outras paradoxos.

Algumas são metáforas. Outras metonímias.

Algumas roubamos dos mestres. Outras recorremos aos livros.

Algumas já nascem crônicas de rua, como arte de chutar tampinhas, como os sem-teto e malacos, como os mestres da sinuca, grande João Antônio, saca? Há, ainda, aquelas que são sobre os marginais, entenda, os poetas marginais, que não tão nem aí pra caceta toda.

Algumas são do louco amor, como aquela do velho Bukowski, o dirty old man da prosa americana, poeta genial e fodido pela vida.

Algumas, criatura sublime, querida menina que me acompanhou por estas linhas trôpegas, são como aquelas, que escrevi quando me viste pela primeira vez e poeticamente me deste.

Algumas são como as do tio Nelson Rodrigues, contam a vida como ela é. Outras são como as de Paulo Mendes Campos, transbordam lirismo, brotinho, maravilhosa, estonteante.

Algumas, cara, a gente nem sabe como começará, pois a coisa não caminha, em hipótese alguma, pra folha em branco, que fica encarando-lhe com olhar furioso.

Algumas nascem daquele diálogo pós-foda, onde os dois estão com um cigarro entre os dedos, conversando sobre a vida.

Algumas saem com um Lou Reed cantando Perfect Day, evocando-lhe múltiplos paraísos libidinais, cujos fluídos corporais ainda ecoam em teu ouvido. Outras ficam no ponto com aquele Fagner, ave María, que cê bota no rádio altas horas da madrugada.

Algumas vão pro papel como o trompete de Miles Davis, em Kind of blue, o clássico do jazz, de 1959, que eleva a energia orgástica de qualquer foda convencional.

Algumas nos emocionam já na primeira frase, como a Última crônica, de Fernando Sabino, que narra a história de uma família pobre, que entra num botequim na gávea, no Rio de Janeiro, e compra uma coca-cola pra comemorar o aniversário do filho.

Algumas são como um disco dos Beatles, leve e cheio de amor. Outras são como um disco dos Stones, rebeldes e pesadas. 

domingo, 16 de outubro de 2016

O Brasil dos gângsteres e o povo

No Brasil dos gângsteres peemedebistas, a ofensiva reacionária traz consequências danosas para o povo. Seria um equivoco atroz acreditar que o impiti irá parar as investigações da Lava-Jato. O governo passa, a polícia continua e a lógica burocrática segue nadando com braçadas voluptuosas, rumo ao tão sonhado neoliberalismo. Mídia, polícia e Judiciário podem divergir em muitas coisas, mas concordam com a trupe que chegara ao poder para defender os interesses da burguesia nacional e internacional, pois o inimigo do povo, José Serra, pretende entregar o pré-sal de mãos beijadas aos gringos.

A burocracia jurídica não pode ser considerada uma classe social, jamais. Organizada e centralizada no mesmo nível hierárquico do exército, ela atua conforme os interesses da elite brasileira e, às vezes, pode, ou não, agir de acordo com quem está no governo. Os burocratas ainda contam com a narrativa dos jornalões, que ludibriam a sociedade com reportagens chapa-branca, repletas de adjetivos nada lúcidos e coerentes. O objetivo do impiti, minha gente, é entregar de bandeja o petróleo às multinacionais.

Infelizmente, os governos petistas não brecaram o capital internacional. Todavia, a aliança entre PMBD e PSDB garante a longo prazo - sem falso otimismo, por favor – a travessia de uma matriz energética para outra. O poeta medíocre, Michel Temer, servirá de instrumento do capital internacional, cujos olhos estão voltados e antenados aos meandros tucanos, sobretudo de Serra, que garganteia na grande mídia falácias neoliberais, de sangrar os tímpanos.

Henrique Meirelles, superministro da fazenda, também é um burocrata da privatização, e que tem como alter-ego, com licença Gilberto Vasconcellos, o vende-pátria, Roberto Campos, que fora adversário da Petrobrás, num tempo não muito distante, no governo FHC. Hoje, o protagonismo de Meirelles será mais nocivo do que no governo Lula, quando ocupou o posto de presidente do Banco Central. Com o impiti, as nações que estão na ponta do capitalismo mundial serão proprietárias do sol e da água doce e, quiçá, do ar, como se cogitou no Peru, na década de 1990. Imagine?

Pois é. Enquanto isso, chego a conclusão de que a justiça é uma senhora altamente volúvel. O jurista do PMDB, o doutô em Constituição, como dele diz Lula, poeta com versos duvidosos, é a anticonstituição em carne e osso. A Carta Magna virou coisa para boi-dormir, sim. Temer não é o todo. Aliás, não é nada. É apenas uma fatia do pão que os gringos possuem, e almejam. Sábio mesmo fora Hugo Chávez, que durante o governo Lula, quando se descobriu o pré-sal, disse que o colega brasileiro estava milionário, com um Oriente Médio no fundo do mar. Chávez avisou: o tal do pré-sal despertaria a ganancia dos imperialistas. Dito e feito.

O golpe que se sacramentou no Brasil têm suas particularidades, típicas de um país que padeceu de três séculos e meio de escravidão, e cuja casa-grande continua de pé, firme e forte. Dilma, na cartada final do impiti, ao invés de colocar sua defesa num Congresso que tanto a desrespeitou, deveria ler a ficha-corrida de seus acusadores, que, naquela ocasião, tinham plena convicção de que eram paladinos da moralidade. Pasme, o que vai ser do futuro?

Pergunta meio óbvia, mas vamos lá. O Brasil têm tradições em golpes. Em 1889, proclamou-se a República com golpe. Getúlio Vargas chegara ao poder, em 1930, por meio de um golpe. E depois dera outro golpe para se perpetuar no Poder e transformar o país numa ditadura, Estado Novo, com inclinações fascistas. Vargas voltara ao poder, em 1954, através do voto popular. Com o lema “o petróleo é nosso”, Vargas, desta vez eleito democraticamente, fizera um governo nacionalista, que visava o capital nacional em detrimento da dinheirama dos gringos.

No final dos anos 50, o que se sucedeu foi a democracia yô-yô-yô que escancarou o País à farra das multinacionais. Os governos depois de Vargas foram o prelúdio para o neoliberalismo de Fernando Collor e Fernando Henrique Cardoso. Em 1964, o desfecho, no entanto, fora totalmente trágico. Os militares, com a ajuda cúmplice da burguesia nacional, chegaram ao poder e levaram o País a uma bad, sem precedentes na história tupiniquim, que durou 20 anos.

Mas o cúmulo foi, em editorial, o jornal dos Marinhos, O Globo, que sucumbe ante a crise que assola a imprensa, sugerir que para as classes mais baixas terem acesso as universidades seria preciso privatizá-las. O Globo, todavia, esqueceu-se de que os pobres teriam uma única opção: bolsas de estudo. Caso contrário, babaú possiblidade de ascender social e intelectualmente. A saída, na visão mimética deles, não é facilitar o acesso de quem vem das escolas públicas, projeto que o PT, tem-se de reconhecer, concretizou nos últimos anos.

Recentemente, o governo lançou uma campanha publicitária cujo lema é “vamos tirar o Brasil do vermelho”. A oligarquia midiática e os burocratas abriram um sorrisão, claro. Lembrei-me do tempo em que se acreditava que os esquerdistas, sobretudo os comunistas, eram devoradores de criancinhas. Ora, ser de esquerda é pretexto para se fomentar discursos repletos de adjetivos equivocados e substantivos inexistentes?

O Brasil, parece, voltara à estaca primária. Multiplicam-se cidadãos com preocupante capacidade de acreditar nas lorotas que são propagadas pelos porta-vozes da casa-grande & senzala. Vocês, senhores que se auto-intitulam nobres, deveriam correr os olhos pelo livrinho homônimo de Gilberto Freyre.

Tenho certeza de apenas uma coisa: sair do vermelho para essa trupe que está no poder é simplesmente entregar o Brasil para os gringos. Queria estar errado, porém atesto com ardor os meandros demente e alucinado do chanceler José Serra, que, certamente, pelo volto direito não chegaria à presidência tão cedo.

Eles, digo, os reacionários, querem transformar o Brasil nos Estados Unidos, mas num Estados Unidos, meu amigo, que já era. Num Estados Unidos onírico e fantasmagórico.

sábado, 15 de outubro de 2016

Bob Dylan, ícone da cultura do século XX



William Blake e Baudelaire, Rimbaud e Walt Whitmann, Allen Ginsberg e Bob Dylan. O que eles têm em comum? A poesia. E mais: transgrediram, como todo bom artista, os costumes e tradições da métrica poética. Mas na última quinta-feira (13), o prêmio Nobel da Literatura entregue ao compositor e cantor Bob Dylan causou espanto entre os romancistas e escritores “de ofício”.

"Se Dylan pode ganhar o Nobel de Literatura, então acho que Stephen King deveria ser eleito para o Hall da Fama do Rock and Roll", ironizou o autor norte-americano Jason Pinter em seu perfil no twitter. "Esse é o Nobel mais sem graça desde que Barack Obama foi premiado por não ser o George W. Bush", provocou o romancista britânico-indiano Hari Kunzru.

Provavelmente, essa não vai ser a última vez que Bob Dylan se envolverá em polêmica relacionada ao conservadorismo artístico. Em meados da década de 1960, ao deixar o violão de lado para segurar guitarras elétricas, Dylan passara a conviver com vaias e, inclusive, incomodou a cantora folk Joan
Baez e outros nomes do gênero ao se apresentar com conjunto de blues elétrico.

Neste período, no Brasil, Elis Regina liderara a criação da “Frente única da MPB” e organizara passeata contra o imperialismo cultural norte-americano, cujo símbolo era a guitarra elétrica. O rock era visto nos circuitos intelectuais como uma simples manifestação adolescente sem conteúdo.

Caetano Veloso e Gilberto Gil, por exemplo, sofreram na pele o preconceito musical por usar, no início do movimento Tropicalista, instrumentos elétricos. Durante turnê nos EUA, em 1966, Dylan chegou a ser chamado de “Judas” por um fã de seu repertório tradicional.

A secretária da Academia Sueca, Sara Danius, comparou Dylan aos poetas William Blake e Arthur Rimbaud, e celebrou a contribuição do músico à cultura. Danius, ainda, lembrou a tradição dos poetas gregos, que Dylan mantém viva.“Eles escreveram textos poéticos para serem apresentados em público, e com Dylan é a mesma coisa. Ainda lemos Homero e Safo, e gostamos até hoje”, afirma.

As letras de Dylan
Como exemplo da genialidade do compositor, Sara citou o disco Blonde on blonde, de 1966, que, de acordo com ela, demonstra brilhantemente a maneira de Dylan pensar e rimar. Aliás, Sara recomenda que para conhecer a obra do artista é necessário começar por esse disco.

Inside the museums, infinity upo on trial

Nos museus, a eternidade vai a julgamento
Voices echo ‘this is waht salvation must be like after a while’
Vozes ecoam ‘é assim que a salvação deve ser, depois de um tempo
But a Mona Lisa musta had the highway blies
Mas Mona Lisa com certeza sentiu a tristeza da Estrada
Visions of johanna” – do disco Blonde on blonde (1966)

A letra de “Tangled Up in Blue” é considerada uma das mais ricas narrativas de Dylan. Ele conta a história de uma mulher que conheceu e ajudou a escapar do ex-marido problemático. A única repetição está no verso que dá nome a canção – o resto da letra se desenrola como se fosse um conto.

Fã e estudioso da obra de Dylan, o escritor e poeta, Fabrício Corsaletti, afirma que Dylan é um “grande poeta narrativo”.“ Suas letras são cheias de sequências rímicas, aliterações e assonâncias, entre outros recursos técnicos. Também é capaz de fazer letras curtas e longas e tem, ao longo de suas obras, muita variação de tons e vozes - o que mostra a sua versatilidade. Mas, além disso, “conta histórias como pouquíssimos sabem fazer”, diz Corsaletti.

“É um tema que todo mundo conhece”, afirma Corsaletti, ao comentar “Idiot Mind”. “Mas a quantidade de coisas que ele cria, o quanto ele é capaz de ir a fundo em coisas que você pensava que conhecesse, é impressionante”. “Ele é um grande criador de imagens poéticas.”

Em “Black Diamond Bay”, de 1976, Dylan constrói a narrativa em fragmentos. “É como se fosse um conto de Júlio Cortázar”, compara Corsaletti.

Prêmio que faltava
Robert Allen Zimmermam nasceu na cidade de Duluth, Minnesota, nos EUA, em 1941. Ganhou o primeiro violão aos 14 aos e começou a se dedicar a música folk e ao blues. Nos anos 1960, descobriu a literatura beat e foi fortemente influenciado pela escrita de Jack Keroauc e Allen Ginsberg, além dos versos de Rimbaud.

Seu primeiro disco foi lançado em 1962. Ao longo de cinco décadas de carreira, Dylan criou 37 álbuns de estúdio. Considerada obra-prima, sua música se focou em questões social, além, claro, de narrar o amor, política e religião. Já escreveu livros, um em dois volumes sobre a própria vida, chamado “Crônicas”, e lançou compilações com suas próprias letras.

Mas o que faltava mesma na galeria de prêmios de Dylan era o Nobel. Ele já fora laureado com Oscar, Globo de Ouro pela canção do filme “Things Have Chaged, da trilha de Garotos Incríveis , em 2001).

Dylan ainda possui um Pulitzer, que é dado a autores relevantes na área de jornalismo e literatura. O Pulitzer veio em 2008 por seu “profundo impacto na música popular e na cultura americana, marcado por composições líricas de força poética extraordinária”.

Link: https://www.nexojornal.com.br/expresso/2016/10/13/O-que-há-de-diferente-em-Bob-Dylan-Nobel-de-Literatura
http://www.cartacapital.com.br/cultura/bob-dylan-o-aedo-moderno