quarta-feira, 19 de agosto de 2015

Vai corintia

Abri meus olhos. Eram oito da manhã. O sol entrava pela janela do quarto, e ia às minhas pálpebras, machucando-as. Levei um cigarro à boca. Deixei-o pela metade e saí da cama. Coloquei Nei Young no som, e lembrei que à noite o Corinthians jogaria contra o Santos, em partida válida pelas oitavas-de-final da Copa do Brasil. “Acho que o timão vai priorizar o campeonato brasileiro”, pensei.

No caminho para o trabalho encontrei vários caras com camisetas do Corinthians. Eles estavam numa espécie de corrente de energia. Vestindo-as, imaginavam que o resultado da partida poderia ser satisfatório. Corinthians x Santos. Mas o timão perdeu o último confronto, pelo brasileirão. Foda, torcedor sempre encontra um motivo para celebrar o pessimismo. Comigo não era diferente. Aprendi com Dostoievski a ser pessimista. Estendi-o ao futebol. E nunca mais me desliguei das palavras do mestre russo. Elas estão vivas dentro de mim.  Às vezes, deixo-as divagando pelo meu cérebro. 
Depois, resgato-as.

- Ei, senhor – eu disse, apontando para o faxineiro da Atento, que estava na companhia de um teleoperador da Vivo -. Pode me arrumar um cigarro?

O senhor estendeu-me a mão, com a carteira aberta. Peguei um. Então ofereceu-me outro. Aceitei.

- Quem vai ganhar hoje? – perguntei.

- O jogo?

- Sim.

- Acho que o timão – disse ele.

Continuei a fumar. Olhei para relógio em meu pulso. Faltavam quinze minutos pra eu retornar à sala de treinamento. Acendi o outro cigarro. E prossegui o diálogo com o senhor. Ele me contou sobre sua vida, suas incertezas, suas loucuras, seus anseios e desatinos. Eu o fitava, compreendo aquelas palavras lúgubres que saíam de sua boca.

- Minha mulher me deixou – falou ele -. Estou na merda.

- Por quê? – indaguei.

- Fiquei sem grana.

O teleoperador da Vivo avisou-nos de que havia acabo seu intervalo. Cumprimentei-o e desejei-lhe boa tarde. O senhor fez a mesma coisa.

- E como está fazendo pra suportar a vida? – retornei a conversa com o senhor.

- Eu vou num mercadinho de um amigo. Compro tudo fiado. Até cigarro – completou, tirando um 
Euro do maço.

- Há quanto tempo trabalha aqui?

- Há alguns anos.

- Sempre a mesma rotina?

- Sempre. Nunca muda – afirmou.

- E você, é novo?

- Sim. Treinamento.

- Banco BMG ou Vivo.

- BMG – respondi.

Aí, ele confessou-me sua paixão pelo Corinthians.

- Ainda bem que tenho o timão.

- Alegria de nossas vidas, e tristeza de nossas vidas. Time do povo – falei.

- Eu só me fodo. O futebol é a minha alegria e lazer – disse ele.

Um sorriso cansado despontou em sua face.

- Quanto tô na merda, encho a cara, assisto o timão e grito.

- hahahahahaha – ri.

Apertei-lhe as mãos, e disse que teria de voltar à sala para o treinamento.

- Boa sorte – desejou.

- Igualmente.

Dei-lhe as costas, e refleti: “A alegria de alguns, simplesmente, é assistir o Corinthians e beber umas cervejas”. A gente sempre esquece que há pessoas que vivem esbanjando dinheiro, andando de Ferrari. Enquanto outras vivem numa merda homérica.

Vai coríntia.  

sábado, 15 de agosto de 2015

LAMÚRIA MASCULINA

No bar. Lá estávamos, pra variar, bebendo uma cerveja atrás da outra. Discutíamos sobre a crise econômica, a crise grega e o conservadorismo pedante e prepotente de Eduardo Cunha. De repente, ouvimos um grito. Era uma voz feminina que implorava por socorro. Virei à face. Um cara, bem vestido, cabelos grisalhos e voz rouca, gritou:

- Não quero mais saber de você!

A moça não expressou alguma reação. Ela estava refém da verborragia dele que, pelo jeito, não sabia nada sobre o sexo feminino. Ele deveria ter passado sua juventude achando que as mulheres estariam aos seus pés num estalar de dedos. Mas a garota, discípula de Balzac, sabia como se portar:

- E eu de você, seu idiota – bradou ela. – a gente não se vê mais. Você não está nem aí pra mim, e nem nunca esteve.

- Como assim?

- Isso mesmo!

- Eu te dou tudo que quer, e é assim que me retribuí?

Ela sorriu. Era um sorriso sarcástico.

Advogada? Jornalista? Professora? Ela tinha jeito de professora, pensei. Levei um cigarro à boca. Fumei até a metade. Aí, apaguei-o e fui à sua mesa. Quando aproximei-me, ela adiantou-se:

- Quem entende os homens?

- Eles são estranhos mesmo.

- Mas não todos.

- Concordo. Só que a maioria tem um complexo de idiotice.

- Engraçado.

- Henry Miller disse que quando amamos alguém, renunciamos tudo. Menos pessoa amada.

Ela arregalou os olhos com fervor, parecendo estar diante de um poeta romântico. Completei:

- Esqueça esse cara – falei, colocando um cigarro à boca -, ele nunca te amou, nem te vai te amar. Ele deve estar mais preocupado com os negócios que vai fechar amanhã e as putas que vai comer amanhã.

Ao concluir, levantei-me. Ela levantou-se junto, e segurou-me pelos braços. Fiquei estagnado, próximo ao caixa do bar.

- Obrigado por ser tão gentil – agradeceu.

- Por nada.

- Ninguém nunca fez isso.

- É o quê faço – finalizei, beijando-lhe o rosto.

Todas as mulheres são especiais. Todas escondem um charme único. Seja gorda ou maga; alta ou baixa; ruiva ou morena; amo-as. Infelizes os usuários das máquinas de masturbação, esperam por uma deusa das academias. Estes não sabem nada sobre elas. E nem procuram saber.