quarta-feira, 30 de novembro de 2016

Eis que os deuses foram maldosos

Um belo dia a Deusa das quatro linhas resolveu beijar os pés dos maltratados, desprezados, excluídos. E desses pés nasceram vários jogadores, espelho de muitos meninos. Sem muita escolha, vieram abraçados a uma lata de 350 ml de Coca-Cola e com uma bola nos pés.

Mesmo antes de aprenderem a andar, sabiam jogar. Na várzea, davam show. Os amigos, claro, ficavam com raiva e começavam a apelar nas entradas. Mas os meninos, criativos que só eles, conseguiam escapar dos carrinhos maldosos dos amigos, que não foram escolhidos pela Deusa.

A bola os procuravam, os reconheciam. Ela precisava deles. Eles a tratavam com carinho, a chamavam para conversar quando todos pareciam tratá-la com desdém. No peito de seus pés, ela descansava. E se embalava no ritmo de seus gingados e molejos. Eles a davam brilho, a davam voz. E ela falava, e deste diálogo milhões de pessoas eram iluminadas com tamanha beleza.

Mas, na última terça-feira (29), os deuses do futebol resolveram ser cruéis. O avião que transportava a delegação da Chapecoense caiu próximo a Medellín, na Colômbia. A equipe disputaria a final da Copa Sul-Americana, na próxima quarta-feira (30), contra o Atlético Nacional. Pela primeira vez em sua história, os catarinenses chegaram à final de uma competição internacional.

O voo levava aproximadamente 72 passageiros, além de nove tripulantes. Desses, 22 eram profissionais da imprensa. De acordo com o portal Fórum, apenas um jornalista sobreviveu. Os outros seis trabalhavam na Fox Sports, emissora que possui os direitos de transmissão da competição.

A Federação Catarinense de Futebol (FCF) decretou luto de 30 dias por causa do acidente. Ao foram ao menos 76 vítimas, incluindo jogadores da Chapecoense. A tragédia ainda provocou a morte do presidente da Federação, Delfim Pádua Peixoto, que era um dos vice-presidentes da CBF.

“A diretoria da Federação Catarinense de Futebol manifesta pesar interminável aos familiares, amigos, cidadãos chapecoenses, catarinenses, brasileiros e a toda comunidade do futebol mundial pela maior tragédia do esporte brasileiro ocorrida com a delegação da filiada Associação Chapecoense de Futebol”, diz a entidade.

O jornalista Juca Kfouri, em seu blog, afirmou que todos os clubes deveriam doar algum jogador promissor para a Chapecoense. Ele ainda sugeriu que os times entrem em campo, na última rodada, com as cores da equipe catarinense.

Realmente, seria bonito e tocante, Juca. 

terça-feira, 29 de novembro de 2016

7 livros eróticos para se ler nas férias

Porque as férias estão chegando e nada melhor do que uma breve lista de livros eróticos para aquecer seus dias ociosos. Ou, por que não?, para abastecer-lhe com um repertório coerente quando for para o lesco-lesco com a moça. Literatura é a vida combinada, ensinou o realista Gustave Flaubert, autor de Madame de Bovary.

Chega de blá, blá, blá e vamos ao que interessa.

Sexus, de Henry Miller – Fenômeno da revolução do amor livre. Leia a trilogia Crucificação encarnada – Sexus, Nexus e Plexus – e nunca mais, como diz Xico Sá, você vai tirar a roupa do mesmo jeito. Garanto.

Delta Vênus, de Anais Nin – Se o cara aí acima não funcionar, encare uma escritora que foi casada com ele. Anais Nin percebeu que Miller tinha o dom da escrita do cacete, e o colocou no caminho da literatura. Caso se interesse, há um filme “Delírios Eróticos – Henry e June”, que conta o relacionamento dos dois, em Paris, no final da década de 1920. A fita foi baseada no diário pessoal da escritora.

A polaquinha, de Danton Trevisan – Equivocou-se quem sempre achou que o “Vampiro de Curitiba” manda bem apenas no conto. Neste romance, você vai se desfazer de sua convicção de que sabe tudo sobre as safadezas de alguém.

Mulheres, de Charles Bukowski – Clássico do dirty old man. Com este título e o velho safado destilando todo seu dom alcoólico, buceteiro e literário, não precisa dizer mais nada. E para completar: a tradução é de Reinaldo Moraes, autor do genial “Pornopopéia”.

Pornopopéia, de Reinaldo Moraes – Tradutor de gente como William Burroughs, Jean Cocteau e Charles Bukowski, o brazuca Reinaldo Moraes chacoalhou o puritanismo que rege a literatura brasileira. Num texto lírico, zoado e instigante, Zeca, o narrador, conta suas bravatas sexuais, repletas de pó, birita e putaria. Bizarro e indispensável.

Tanto faz, de Reinaldo Moraes – Mais um do Reinaldão. Escrito em Paris, num período em que o próprio autor estava curtindo uma bolsa de estudos, Tanto Faz narra peripécias sexuais, alcóolicas e canábicas de Ricardo, protagonista e uma espécie de alter-ego de Reinaldo. Fundamental.

Bonitinha mas Ordinária ou Otto Lara Resende, de Nelson Rodrigues - sacanagem à brasileira com uma pegada suburbana. Nelsão é obrigatório em qualquer seleção de sacanagem literária do planeta.

E você, raro leitor, do que sentiu falta? Deixe seu comentário.

segunda-feira, 28 de novembro de 2016

O homem, a mulher e a pornografia

Antes de tudo: a pornografia é o erotismo dos outros. Vai que é tua, George Bataille.

Quando nos interessa, a sacanagem é tratada como material puramente erótico, sagrado, bonito e refinado. Se alheio, não passa de mera putaria, para parafrasear Reinaldo Moraes, em Pornopopéia, daquelas que a gente vê aos montes com apenas um clique na internet.

E chega de frescura literária. A não ser, claro, que o amigo insista na leitura de um capítulo da bíblia que deixaria Henry Miller cabisbaixo. Cantares, Cântidos de Salomão ou simplesmente Cântico dos Cânticos.

Esquece, porra.                                                              

Finalmente, vamos à sacanagem propriamente dita. Afinal de contas, essas teorias sobre a diferença entre erotismo e pornografia são de uma frigidez ou de uma paumolescência que deixaria qualquer um com a libido retraída.

Foda hein, tio Reich.

Acabei de descobrir, num exercício de pesquisa para conseguir finalizar esta crônica miserável, que o Brasil e as Filipinas lideram o consumo de vídeos pornôs por parte das mulheres. A pesquisa foi encomendada, pasme, pelos sites especializados “Pornhub” e “Redtube”.

Mas o tesão é tentar entender o barato, mesmo que este cronista bebum e mal-diagramado, apaixonado e escravo das moças nunca chegue sequer nem perto de tal façanha.

Obviamente, o macho é mais visual. Basta um toque para deixá-lo totalmente armado. O cara, na maioria das vezes, sente fetiche com o gozo na boca, com jatos irreais pela face, aquele clichê zoado que ainda não evoluiu desde a selvagem era das produções Buttman.

Se bem que há uns por aí que com apenas um trago num vinho tinto vagabundo e uma bola num beque mais ou menos conseguem jogar a autoestima das damas lá embaixo.

E outros, no ápice da cretinice, não toleram ver uma moça livre e dona de si.  

Falta um Henry Miller, um Bukowski, um Nelsão na vida desses seres desatentos aos sinais femininos. Ah, recomendo, também, a leitura do clássico Ofício de Viver, do Pavese, que cito pela enésima vez neste espaço solitário.

É, vou vagar por ai, amigos, aqui fica o beijo e admiração ao sexo feminino, mas antes teria de firmar Walt Whitman, o poeta que corria atrás dos marinheiros, em Nova Iorque, no século XIX, como testemunha do que tenho doravante a dizer. Com ou sem amor, evidentemente.

Vai lá, Whitman: “Não falta nada, mas faltaria tudo, se faltasse o sexo”.

domingo, 13 de novembro de 2016

Cartilha amorosa

Namorar é bom. Isso é quase tudo que sei sobre o amor. Nunca soube muito bem como me comportar diante da mulher amada – ou qualquer outra mulher que me direcionasse um olhar cintilante e florescente. Os encontros com a dama pretendida eram um trabalho jocoso que transitava entre insegurança e excitação. Do tipo que me fazia pensar: “vou com a minha velha camiseta dos Rolling Stones, ou com uma camisa social que têm os botões todos em plena atividade?”.

Em minha inexperiente cachola de amante aprendiz pululam questões de cunho fervilhante. Por incrível que pareça, sempre surgem dúvidas e perplexidades relacionadas à vestimenta. Quando li Ofício de viver, do Pavese – um misógino doidão que não podia viver sem o charme feminino -, comecei a me atentar pros sinas práticos do corpo delas, como o olhar, por exemplo, a característica e o sinal mais sublime do ser feminino.

Foda mesmo é quando você tá na mesa, a conversa fluindo e, de repente, bate aquele tesão incontrolável. O maço de cigarro vai embora como se fosse a última musica do Let it be. Controlar o desejo sexual, pondero, é uma atitude que requer certa experiência do cara – e alguns diálogos consigo mesmo, digo, com seu desvairado psiquismo.

O que eu devo fazer? Devo cair de boca aqui mesmo? Ou na sala do seu apê, ou do meu apê, que é um lugar sossegado, pois meus velhos estão viajando? Dá pra pitar um du bão e ouvir um The Doors, ou qualquer outro som, cê que manda, gatinha.

Ou, também, a gente pode assistir àquele filme do Godard, sabe? Ah, cê não curte cinema cabeça? É chato, eu sei. Mas podemos, sem problemas, ver uma comédia romântica, estilo Woody Allen. O estilão dele é do caralho, né? Mas vamos evitar os clichês hollywoodianos, que como diz o Jabor, num raro texto em que achei bom, prostituiu Aristóteles, cuja mocinha morre de câncer no final, quando todos os obstáculos do casal pareciam superados.

Esses filmes fazem escorrer algumas lágrimas deste camarada bebum que vos escreve. Outono em Nova Iorque é um desses. Chorei pacas quando o vi. Tava meio bêbado, ainda. Imagine a cena. Dizem que homem que é homem não pode chorar em hipótese alguma. Lorota pra boi-dormir, cara. Homem chora, sim. Outro dia vi o Marcelo Rubens Paiva, numa crônica, falar que chora facilmente. Confesso que ao findar a leitura, senti-me livre como uma criança que joga bola com os amigos, após a aula.

Mas, e depois do filme? Fumaremos um cigarro? Ou vamos direto pro sexo?

Cansei de me perder em questões ridículas como essas. Ao mesmo tempo, intuía, no fundo do meu raso e superficial entendimento dos meandros femininos, que vestir as mais adequadas roupas, adotar rebuscadas maneiras, ver tal e qual filme, ouvir este ou aquele disco, comer neste ou naquele restaurante, beber naquele bar decente ou naquela espelunca, não ia mudar grandes coisas no psicossomatismo da mulher desejada. A química do amor é espetacularmente misteriosa. É um jogo cujo objetivo é ser subjetivo. Deu pra enteder? Porra nenhuma, não. Em todo caso, vale a pena ficar atento as dicas e conversas das amigas mais íntimas.

Dia desses, folheando uma revista feminina na sala de espera do meu médico, topei com uma “consultora sentimental” dando dicas primorosas sobre como um homem deve ser e estar ao lado da dama que ele corteja. A lista, meu amigo, é longa. Deveria tê-la lido alguns anos antes. Evitaria inúmeros transtornos.

Pra começo de conversa, nada de banho de loja antes de encontrar a mina. Nem de negligência indumentária. A regra básica é o meio-termo: arrumadinho, mas sem exibicionismo. E é bom maneirar com os palavrões, porra. Tampouco é recomendável jogar na conversa assuntos cujo entendimento se restringe a quem tem phd em Ciências Sociais, na USP. A puta da realidade fica pra depois – se houver um depois. O papo cabeçudo, quiçá, nem deve ser colocado em pauta, sobre a possibilidade de ela lhe deixar chupando dedo junto de sua dialética marxista.

Até de etiqueta sexual a tal da consultora falava. O recado era basicamente: não vá com sede ao pote, de modo que você deve respeitar o tempo dela, não invente posições que requerem certo malabarismo, não fique bradando sacanagens baratas ao pé do ouvido da moça na hora do lesco-lesco, jamais dispense camisinha, nem diga que é uma lúbrica merda transar com o pau revestido, não a induza a notas positivas sua performance sexual. Não demonstre, jamais, afoiteza em vazar depois da foda. E por aí seguia a preleção da consultora sentimental.

Fiquei, confesso, um pouco deprimido ao ler aquilo tudo, que me soava como um murro bem no meio das minhas convicções machistóides, jorrada, reconheço, aos borbotões na mesa do boteco e, inclusive, saudada e apoiada pelos companheiros de birita.

Por fim, corri os olhos sobre as dicas da consultora, com considerável pressa, pra ver se encontrava alguma coisa em que me sobressaísse.

Achei um, finalmente:

“O homem tem quer ser limpinho, de preferência emanando um discretíssimo perfume masculino à base de madeiras aromáticas.”

Bem, tirando as “madeiras aromáticas”, acho que posso ser considerado, tranquilamente, um cara limpinho. Não dispenso meu básico chuveiro diário. Ainda mais com esse calor surreal que faz em Goiânia. Calor este que deixaria Salvador Dalí cabisbaixo. Agora de uma coisa posso me gabar: as mulheres já me xingaram de tudo e mais um pouco, com e sem razão, mas nunca pintei de fedido. Não que eu tivesse ouvido, pelo menos.

Como cantavam os Beatles: “Something in the way she moves/Attracts me like no other lover”.