Enquanto escrevo, a noite
desponta no céu. Terminei a frase, deu-me vontade de fumar um cigarro, arejar o
pensamento e colocá-lo em ordem. Saí de frente do computador. Enchi uma xícara
de café, bebi-a e abri a porta de casa. Ao fechá-la, deparo-me com uma garota.
“Olá” – digo. “Tudo bem” – responde ela. Abri um sorriso no canto da boca e
segui até a guarita do meu condomínio.
Final de tarde. Calor, preguiça e
um texto para escrever. Sempre deixo meus afazeres para depois, e quando chega
o dia de entregá-los, fico desesperado. Resmungo e nada resolve. Mas foda-se, a
vida é assim. Alguns querem dinheiro, carros, status, eu quero apenas uma
boceta e se possível um uísque original para adocicar a transa. Dei uma volta
na esquina. “Podia beber hoje, né” – pensei, alimentando uma hipótese, que têm
chances de se concretizar. Levei as mãos ao bolso, e encontrei uma cédula de
cinco reais. Dava uma cerveja e um cigarro solto. Fui até a distribuidora de
bebida e comprei-os.
Caminhando de volta à minha casa,
eu pensava em como terminar aquele texto. Precisava pelos menos mandar algo
para o jornal. Eles haviam me mandado um e-mail. Nem lhes respondi. Hoje, sem
ter escapatória, sentei-me em frente ao computador e escrevi. O ensaio – sobre
a contracultura que seria pulicado no caderno opinião pública do Diário do
Cerrado – dava-me trabalho.
Levei minha mão ao trinco da
porta e girei-a. Entrei em casa, tirei meu tênis e apaguei o cigarro no
cinzeiro. Finalizei meu texto. Ele estava com forma e harmonia. “Agora está
faltando a birita” – pensei. Recorri ao telefone. Nada. Todos tinham alguma
desculpa. “Hoje não dá, amanhã tenho que trabalhar” – falavam sem entusiasmo.
“E daí, eu também tenho” – afirmava caindo na gargalhada. Eu não iria ficar sem
beber, disso tinha certeza. Estava buscando uma alternativa para biritar. Tudo
é motivo para a bebida. Bebemos na alegria. Bebemos na tristeza. Bebemos para
afogar as lágrimas. Bebemos para comemorar a solidão, a monotonia. Bebemos por
porra nenhuma. A gente bebe, simplesmente.
Peguei minha mochila e coloquei
dois livros dentro dela. Eu tinha de devolvê-los para Rogério. O cara
cobrava-me em todo momento. Não podia me ver na rua que vinha com sua voz
trêmula e rouca: “Cadê meus livros, filha da puta”. “Calma porra, estou lendo”
– sussurrei com as cordas vocais repletas de tabaco, maconha e álcool.
Saí de casa por volta das 20h da noite.
Rogério morava perto da Avenida Independência, no Setor Vila Nova. Em frente ao
seu condomínio, havia um bar. O dono do boteco já me conhecia e sempre tinha um
comentário na ponta da língua. “E aí corintiano safado. O quê você vai
roubar?”. Quase sempre optava pela risada. “Me dá uma Antarctica” – pedi,
enquanto esperava Rogério – “tenho de lubrificar a palavra”. Após dez minutos,
o sujeito apareceu. “Estou sem dinheiro. Não consegui nada, nada” – disse com
tristeza no olhar. “Acho que nem vou beber nada”. Balancei os braços
demonstrando meus pêsames. “Pode deixar que vou beber por você, cara” – provoquei.
Rogério deu-me as costas e fora
embora. Com 50 reais na carteira, eu não iria para casa sem mulher. Iria atrás
delas. E falaria palavras de conforto. Eu sei o que elas querem ouvir. Talvez
declame algum poema. Ou cante Touch Me.
Sinto o cheio de boceta.
- e aí Mano Jaynes – gritou
Selton, com o sorriso que lhe era caraterístico no fundo do rosto – vamos
chapar?
Como não havia outra escolha,
aceitei o convite.
Selton pediu uma cerveja. Silas,
rapidamente, trouxe-a. Selton morou em Portugal durante dez anos. Seu sotaque
ainda é um pouco lusitano. Ele é uma figura rara entre os homens. Se colocar
vinte pessoas ao seu lado, ninguém será igual a ele. A energia, a facilidade
para protagonizar histórias bizarras, faz de Selton um cara único. Com ele é
assim: ou você vira seu amigo, ou odeia-lhe. Ele fala ininterruptamente na mesa
do bar. Selton carrega consigo o furor da boemia, a loucura da vida, a clareza
à bebida e quaisquer tipos de entorpecentes.
Bebemos quatro garrafas de
cerveja, e ele sugeriu:
- vamos num bar ali embaixo? Só
tem bandido!
- claro, por que não?
Ele dera uma risada e emendara:
- vou buscar um uísque em casa.
Daqui a pouco eu volto, de boa?
- de boa – repeti – traga para
mim, por favor, uma blusa. Tá frio – pedi, tremendo o corpo, quando o vento do centro-oeste
contagiavam meus ossos.
Coloquei as mãos no bolso da
calça. Uma criança e uma senhora passaram por mim, e ninguém disse nada. Apenas
fitaram-me.
Selton apareceu após alguns
minutos, com uma dose, gentil, de uísque em mãos. “Tome um gole” – ofereceu. A
bebida desceu leve, suave e bravamente pela minha traqueia.
Bâbados, andávamos no meio da
rua, gargalhando e falando palavras misteriosas para os ares.
Chegamos ao bar. A música que
saía da jukebox era um sertanejo universitário. Comecei a sentir os sintomas de
náusea. Então Selton, brilhantemente, dera-me cinco reais e disse:
- coloque um som pra nós.
Eu peguei o dinheiro e fui até a
máquina. Permanecei por alguns minutos tentando entender como se faz para manuseá-la.
Quando descobri, chegou um cara ao meu lado e encarou-me profundamente. De
fato, o lugar dava medo. As pessoas, todas, tinham uma expressão brava e triste.
Eles simulavam feições de durões, mas não passavam de seres ensandecidos,
monótonos e solitários – que assim como eu, estão na noite, atrás de bebida e
mulher. Selecionei Tim Maia, Planet Hemp e Raul Seixas; Selton pediu mais um
litro de cerveja. “Viva, viva, viva a sociedade alternativa/Viva a sociedade
alternativa” – cantava Raul. Tive a impressão de que tudo mundo soltou-se
quando a canção entoou no boteco. No intervalo de uma música à outra, um amigo
de Selton chegara. O sujeito tinha aparência comportada. Falava pouco e quase
nunca fazia uma brincadeira. Era o tipo de pessoa que a qualquer momento pode
tirar uma arma e pôr em sua têmpora. Tinha o aperto de mão forte e robusto. “Há
umas garotas na mesa ali, vamos sentar lá?” – propôs o cara. Sem pestanejar,
levantamo-nos e fomos. Distribuí beijos nos rostos das moças e sentei-me ao
lado de uma delas.
Sem falar nada, minha mão roçou
as pernas da moça que estava sentada próxima de mim. Então tardei a falar junto
ao ouvido. As palavras soavam ofensivas. Porém, ela retribuíra. Tocara em meu
pau, e ele subira. “Aqui não” – murmurou em meu ouvido, com as mãos dentro de
minha calça. Uma garota que sentava-se em meu lado, olhara com espanto. Nada
disse.
- vamos sair daqui – disse,
enquanto sinalizava para Selton – a gente pode conversar num lugar mais a
vontade.
- tudo bem.
Andamos cerca de duas quadras.
Ela parou e beijou-me. Enquanto eu sentia seus lábios, suas mãos agarravam meu
caralho. Em pouco tempo, ele estava duro, pronto para a foda. Ela notou a
ereção e logo desabotoou o zíper da calça, mergulhando em minha rola. Eu só via
o movimento de sua cabeça, sendo iluminado por um poste que havia em cima de
nós. Quando saciou um pouco, eu virei-a de quatro e enfiei meu pau naquela
bocetinha e um cara passou rindo. Eu a bimbava, ali mesmo, na rua. Um guarda parou.
Tentei tirar o caralho de dentro da boceta, mas não dera tempo. O policial
observou-me e falou:
- dando uma trepada no meio da
rua, cara?
Sem graça, concordei com a
cabeça.
- mas você sabe que é crime, né –
disse com segundas intenções. – eu posso levá-los para a delegacia – completou.
Eu acendi um cigarro e pensei em
como iria sair deste problema. Cogitei várias desculpas. Depois cheguei à
conclusão de que nenhuma o convenceria.
- seria bom se você molhasse
minha mão, não? – sugeriu o policial de forma sarcástica. – a vida tá difícil
para todo mundo. Com a crise financeira, a gente não sabe o que fazer para
viver com dignidade.
Por um momento considerei
mandá-lo à merda. Contudo, entreguei ao guarda uma nota de 20 reais. Ele a
principio resmungara. Eu vesti as minhas calças, a garota também vestiu as suas
e fomos caminhando, devagar.
“Você é maluco demais, mocinho” –
disse-me ela. – “Cê não viu nada ainda, não” – completei.
Olhares, risadas e beijos para
todos os lados.
As mulheres são a beleza da vida.