Algumas saem fáceis, como as de
Rubem Braga. Outras são um pouco mais difíceis, e a gente tem de suar, digo,
passear os dedos pelas teclas, para que a ideia baixe no papel.
Algumas são fáceis como beijos
roubados de mulheres difíceis, que nos deixam encabulados, logo nós, homens,
seres altamente limitados, cuja vida resume-se a porres no boteco manjado da
esquina e comentários mordazes sobre o jogo do Timão.
Algumas, amigo, são crônicas de
britadeiras, saem na marra, à força, como se fosse o último cigarro que há em
tua carteira de Marlboro. Outras, cara, vão pro papel carregadas de lirismo, mas
não podemos esquecer de que algumas, também, estão só o fiapo da narrativa, sem
sustança, sem tutano. Aí se tem de apelar pra metalinguagem – a crônica sobre a
falta de assunto.
Algumas vem ao mundo pra
confundir a audiência, são crônicas-travestidas. Pois é, a gente não tem a
mínima ideia se o troço é conto, crônica, ou poema em prosa.
Algumas não têm jeito, não. Ah,
elas eram apenas notícia, mas aí vai um tal de Moacyr Silar e as transforma naquele
texto precioso, que brilha como a lua numa rua deserta.
Algumas são de costumes, e até
ficam como registro histórico, como as do João do Rio – já ouviu falar?
Algumas são aliterações. Outras
paradoxos.
Algumas são metáforas. Outras
metonímias.
Algumas roubamos dos mestres.
Outras recorremos aos livros.
Algumas já nascem crônicas de
rua, como arte de chutar tampinhas, como os sem-teto e malacos, como os mestres
da sinuca, grande João Antônio, saca? Há, ainda, aquelas que são sobre os
marginais, entenda, os poetas marginais, que não tão nem aí pra caceta toda.
Algumas são do louco amor, como
aquela do velho Bukowski, o dirty old man da prosa americana, poeta genial e
fodido pela vida.
Algumas, criatura sublime,
querida menina que me acompanhou por estas linhas trôpegas, são como aquelas,
que escrevi quando me viste pela primeira vez e poeticamente me deste.
Algumas são como as do tio Nelson
Rodrigues, contam a vida como ela é. Outras são como as de Paulo Mendes Campos,
transbordam lirismo, brotinho, maravilhosa, estonteante.
Algumas, cara, a gente nem sabe
como começará, pois a coisa não caminha, em hipótese alguma, pra folha em
branco, que fica encarando-lhe com olhar furioso.
Algumas nascem daquele diálogo
pós-foda, onde os dois estão com um cigarro entre os dedos, conversando sobre a
vida.
Algumas saem com um Lou Reed cantando
Perfect Day, evocando-lhe múltiplos paraísos libidinais, cujos fluídos
corporais ainda ecoam em teu ouvido. Outras ficam no ponto com aquele Fagner,
ave María, que cê bota no rádio altas horas da madrugada.
Algumas vão pro papel como o
trompete de Miles Davis, em Kind of blue, o clássico do jazz, de 1959, que
eleva a energia orgástica de qualquer foda convencional.
Algumas nos emocionam já na
primeira frase, como a Última crônica, de Fernando Sabino, que narra a história
de uma família pobre, que entra num botequim na gávea, no Rio de Janeiro, e
compra uma coca-cola pra comemorar o aniversário do filho.
Algumas são como um disco dos Beatles,
leve e cheio de amor. Outras são como um disco dos Stones, rebeldes e pesadas.
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