quinta-feira, 28 de agosto de 2014

Sexus - a crucificação encarnada

Sexus foi lançado em 1949

São 500 e poucas páginas de ensinamentos preciosos.

Aqui na minha edição, roubada de um sebo, toda rabiscada; consegui aprender um pouco mais sobre a vida. Compreendi o sexo, se não na sua totalidade, pelo menos um pouco, disso estou assegurado.

Sexus – a crucificação encarnada – durante um bom tempo passou a me acompanhar em todos os lugares que eu ia. Foram inúmeros bares. Vários porres. Incontáveis baseados. Milhares de beijos. Histórias são o que não faltam a este livro, ao meu livro.

Quando me perguntam qual livro mudou a minha vida, respondo: ‘Sexus, ora’. Não há como ser outro.
Sexus compõe o primeiro volume da trilogia ‘A crucificação encarnada’. Os outros são Plexus, lançado em 1953 e Nexus, em 1960.

De Charles Bukowski aos Beats, Miller serviu de influência. E olhe, o velho safado, odiava os escritores, os achava chatos, monótonos e depressivos. Mas com Miller era diferente. O seu estilo porra louca, de quem não estava nem aí para as convenções sociais, nos faz refletir. Refletir, sobre as coisas mais banais da vida, como a insipidez a que nos submetemos corriqueiramente.

A trama da obra é repleta de sexo. Henry Miller narra as suas aventuras sexuais, nos EUA, em Nova Iorque, ao lado da sua esposa. Depois ex-esposa. O contexto vigente era a década de 20/30.

O primeiro romance, Trópico de Câncer, do autor chagou a ser censurado em alguns países de língua inglesa, sendo acusado de não ser literatura, mas sim, pornografia.

Miller lançou o seu primeiro livro, aos 50 anos. Enquanto Hemingway, Fitzgerald e Steinbeck apreciavam Paris, em plena liberdade; Miller gozava de algo maior. Uma liberdade sem limites, sem imposições, sem frescura; porém com total desapego da materialidade.

Esse era Henry Miller, o escritor que de um jeito ou de outro, revolucionou a prosa americana com a sua metafísica sexual.

Simplesmente sensacional.

E absolutamente recomendável.

domingo, 24 de agosto de 2014

A maior expressão do 'corinthianismo'

Doutor Sócrates
A Democracia Corintiana revolucionou a estrutura reacionária e paternalista do futebol brasileiro. Era o prelúdio de uma utopia que até os até os dias atuais o Brasil não chegou a conhecer. 

O ano era 1982. A MPB vivia de metáforas e quase não atingia a juventude. Seu discurso era destinado para um determinado segmento da sociedade, mais intelectualizado e com maiores condições de acesso à informação. Havia poucas bandas de rock. Chico Buarque, Caetano Veloso, Tom Zé, Gilberto Gil, Elis Regina; entoavam as vitrolas pelo Brasil.

Neste período o Brasil começava a se preocupar com a inflação, que devastaria a economia, durante o governo de José Sarney. Dentro das quatro linhas, a fantástica seleção de 1982 havia perdido para a Itália, em uma verdadeira tragédia, dessas que dificilmente será explicada e compreendida. Por sua vez, o Corinthians vinha de um mandato praticamente ditatorial. Por anos um único presidente ditou as regras no clube. Entretanto, um grupo politizado de jogadores começou a exercer seus direitos de liberdade e democracia. Todos no clube votavam e exerciam influência sobre o futebol corintiano. Do treinador ao centroavante. Do roupeiro ao servente. Todos eram iguais. Estava nascendo aí, a maior utopia do futebol brasileiro e da sociedade brasileira: a Democracia Corintiana.

A DEMOCRACIA CORINTIANA

Segundo jornalista Juca Kfouri, o futebol brasileiro é ‘corrupto, corruptor e reacionário’. Aqui, os jogadores são alienáveis, tornam-se escravos do dinheiro e viram pop-stars. Sem consciência política alguma, os dirigentes, a mídia e os empresários, fazem deles verdadeiras mercadorias, cujo lucro para todos é altíssimo. Diante desta áurea toda, a política vira segundo plano aos jogadores.

Sócrates Brasileiro Sampaio de Souza Vieira de Oliveira não era nome de jogador de futebol. Nem porte físico ele tinha. Fumante, apreciador de uma cerveja, comunista, médico e politizado; Sócrates preferia o caderno de política ao de esportes. Era filiado ao PT – recém fundado -, e não gostava de treinos nem de concentração.

Suas principais contribuições para o futebol brasileiro não foram seus geniais passes de calcanhar. Sócrates brilhou fora de campo. E quis o destino assim. Sócrates fez jus ao nome. Tornou-se pensador do futebol brasileiro, ao liderar a Democracia Corintiana, que mudaria para sempre os rumos do alvinegro e dos jogadores envolvidos.

A Democracia foi uma espécie de autogestão futebolística que teve como resultado os títulos paulistas de 1982 e 1983. Depois de forte pressão política exercida pelos atletas – que culminou na queda do presidente Vicente Matheus, folclórico “ditador” corintiano –, jogadores, comissão técnica e diretoria passaram a decidir, no voto, tudo o que fosse de interesse para o clube: contratações, demissões, escalação da equipe, data e local de concentração e outras coisas que, antes, cabiam somente aos cartolas. Tudo era resolvido no voto. E os votos tinham o mesmo peso: do goleiro reserva ao presidente do clube. Era mais ou menos como se os operários de uma multinacional começassem a opinar e a decidir sobre os rumos da empresa.

Para o sociólogo Emir Sader, a Democracia Corintiana foi o prelúdio de uma experiência que até hoje o Brasil não exerceu plenamente. “Essa experiência aconteceu surpreendentemente e prematuramente no Corinthians, o time de futebol mais popular do Brasil. Quando ninguém no país podia votar, os jogadores daquele grupo conquistaram o direito de decidir sobre seus rumos”.

Nesse período o Corinthians passou a ser o primeiro clube brasileiro a usar a camisa com fins publicitários. O publicitário Washington Olivetto, idealizador do termo ‘Democracia Corintiana’, sugeriu que ao invés do time usar logotipos de empresas, o Corinthians usasse mensagens de cunho político, como: “Democracia Já”, “Quero votar para Presidente” e outras que causaram certo impacto na estrutura militarista – que governava o país -, e paternalista – que comandava o esporte, sobretudo, o futebol. No auge do movimento, o brigadeiro Jerônimo Bastos, presidente do Conselho Nacional de Desportos (CND), chamou o presidente do clube e avisou: “Vocês não podem mais usar esse espaço para fins políticos; caso continuem, vamos engrossar o caldo, vamos intervir no clube”.

Em 1983, Zé Maria chegou ao posto de treinador da equipe, através do voto dos jogadores e de todos os funcionários do clube. Após o episódio, o Jornal da Tarde, estampou a seguinte manchete: “Os jogadores chegam ao poder”.

No entanto, a convivência entre os jogadores e a imprensa não foi das melhores, como lembrou Sócrates, posteriormente: “Durante a Democracia Corintiana, existiu um processo ideológico por parte dos veículos de comunicação mais conservadores a fim de caracterizar ou rotular nosso movimento como um sistema frágil perante a opinião pública. Alguns sentiam a necessidade de fazer isso, até porque a Democracia Corintiana passou a ter um peso na história do país, no processo de democratização pelo qual passava o Brasil”.

A Democracia começou a se dilacerar quando Sócrates deixa o Corinthians para jogar na Fiorentina, na Itália. Sua ida não foi causada por realizações financeiras. Sócrates havia prometido que se a Emenda Dante de Oliveira fosse aprovada ele iria embora do Brasil.

Em 1984, a Emenda foi reprovada. O povo brasileiro seguiu sem votar para presidente, e o Doutor deixa o Brasil rumo a Itália. Sem sua maior liderança, a democracia fica enfraquecida. A venda de Casagrande ao São Paulo, representa o segundo grande baque. E, infelizmente para o Corinthians e para o futebol, Roberto Pasqua, ligado à Vicente Matheus, derrota Adilson Monteiro Alves no pleito de 1º de abril de 1985 por uma diferença ínfima de votos, assumindo a direção de futebol do clube sob denúncias de fraude e compra de votos.