Abri a porta, e entrei em casa. Mais um dia de trabalho. Eu
trabalhava 8 horas por dia, de segunda a sexta. No sábado estava no serviço,
também, mas pela manhã. Saía do trampo, e ia para a casa. Minha esposa, meu
amor. Ela estava sempre assistindo televisão. Abraçava-a e perguntava como
havia sido seu dia. As respostas eram sempre iguais . “Bem”, dizia ela. Era a
vida que eu escolhera para mim. Meus amigos falaram que o casamento não seria
uma merda. Mas eu ignorei-os. A vida de cônjuge me agrava.
Deixei meu paletó sobre o sofá. Fui ao banheiro, mijei e
troquei de roupa. Desci à cozinha, e perguntei o que faltava em casa:
“Nada”, respondeu-me Jordana.
“Temos pão”, quis saber eu.
“Aham”, balbuciou ela.
Abri uma sacola e encontrei alguns pães. Comi-os, e avisei
Jordana que iria dar uma volta:
“Trabalho, né”, constatou ela.
“Sim”, respondi. “Devo voltar lá pelas 22h”, avisei.
Entrei em meu Camaro. Liguei-o e dei a partida. Ouvi o ronco
do motor e imediatamente uma sensação de vaidade me tomara. Ninguém na
vizinhança tinha um carro esse. Eu era o único. Os vizinhos, certamente,
haviam escutado o motor. Meu carro, idiotas. Podem babar.
Parei no semáforo. O céu estava claro, porque a lua o
iluminava. Bela imagem. De repente, uma luz verde refletiu no vidro do carro.
Era o sinal. Arranquei, andando a 60 km por hora.
Virei numa esquina, nada. Em outra, nada. Novamente, porra
nenhuma. “Vai ver é por que está frio”, cogitei. E de fato, fazia uns 15 graus
em Goiânia. Dobrei na 136, no Setor Marista. Pisei fundo no acelerador. Achei
um crioulo na rua. Fitei-o, descaradamente. Saí. Dei uma volta na esquina e
voltei para lá.
“E aí, brother”, eu
disse. “Não tem um desse aí, não”, perguntei, solicitando uma pedra de crack.
“Tenho, sim”, falou ele.
“Entra”, pedi.
Ele veio até a porta do carro. Apontei-lhe a arma,
discretamente, e disse:
“Entra já, ou vai morrer”.
Sem pensar duas vezes, o cara entrara em meu carro. Saí
dali.
“É o seguinte: nós vamos dar uma volta. E eu só quero
conversar, beleza?”, avisei .
Mais calmo, ele perguntou se podia acender um cigarro.
Disse-lhe que ‘sim’.
Demos três voltas na Praça do Cruzeiro. Descemos até a Praça
Cívica e voltamos à Praça do Cruzeiro. Ele estava tranquilo.
Parei o carro numa rua deserta e escura.
Pahhhhh pahhhhhh pahhhhh.
Olhei para a cabeça dele. Vi só sangue. Tirei o corpo, e o joguei na rua.
Liguei Mozart no pen-drive do carro.
Cheguei em casa, Jordana estava vendo Jornal da Globo.
“Tudo bem?”, falei, beijando-a. “Tudo”, respondeu.
É isso aí: mais um trabalho concluído.