sexta-feira, 23 de janeiro de 2015

Amor molhado pelo rum


Eu não lembro como conhecemo-nos. Tudo está tão enfumaçado em minha mente. Talvez eu estivesse bêbado, pra variar. Ou, simplesmente, não me recordo. Faço esforço, e nada. Quando me dei conta, já estávamos conversando sobre livros e discos. Eu abria uma cerveja. Ela olhava-me, no fundo da retina, com seus olhos vivos e castanhos, e discorria sobre Drummond. “Aquele poema todos o conhecem: Tinha uma pedra/uma pedra no meio do caminho/ tinha uma pedra no meio do caminho/ no meio do caminho tinha uma pedra”. Eu olhava-a e acendia um cigarro. Ficamos durante vários minutos conversando sobre literatura. Passamos para música. Enquanto escrevo este texto, veio-me à mente uma canção de Gal Costa e Zeca Baleiro, que ouvíamos juntos, entre quatro paredes. Tudo era felicidade. Eu sentia-me livre, solto, imortal. Hemingway tinha razão, somos imortais quando o sexo é bom.

Tudo terminou de uma maneira que até hoje não compreendi. Brigamos. Falamos coisas pesadas um ao outro. Passaram-se alguns meses, e não a vi. Fui para o meu lado, segui a minha vida. Fiz vestibular, não passei. Nas férias, no bar, ela apareceu. Sua veste era simplesmente provocante. Eu a queria. Ansiava por fodê-la a noite toda. Fodemos. Gozamos. E o dia nasceu feliz para mim e para ela. Acordei lá pelas 13h. Fui-me embora. A partir daquele dia, não tive notícias dela. Tudo passou, como uma estrela no céu. Agora veio à minha mente tudo o que vivemos. Ela, até onde sabia, havia arrumado um namorado. Eu a fodi, quando estava namorando. Isso é um troféu que carregarei por toda a minha vida. Meti em uma mulher comprometida.

Uma vez fui à sua casa, durante a tarde, beber. Bebemos, conversamos e fodemos. Sua irmã ligou e disse que iria lá para assar um churrasco. Entrei em pranto. Porra, a mulher era inteligente, professora universitária, do curso de Economia. Eu estava bêbado. O que conversaria com ela? Sobre livros? - Caralho pensei: estou fodido - . Fomos ao supermercado. Mas antes, passamos em um bar. Jogamos uma sinuca. Bebi três doses de uísque. Saí dali tropeçando no próprio andar. No mercado, abracei uma garrafa de rum. Retornamos à cerimonia. Conversei com sua irmã, mesmo embriagado. Ela saiu falando que eu era um rapaz inteligente. Afirmou que o futuro reservaria coisas boas pra mim. Mal sabia que eu trepava com a sua irmã. Queira o destino, que ela não sabia até hoje. Imagina eu chegar à minha cidade natal, e deparar-me com ela. Certamente me olharia todo, dos pés a cabeças, e falaria: “seu filha da puta, sem vergonha”.

Todos foram embora. Dormi em sua casa, neste dia. Bebemos rum e cerveja. Ela ligou o rádio. Tocava Frank Sinatra. Ritmo bom para o sexo, pois é calmo, tranquilo. “Eu quero você me coma”, disse-me. Eu olhei-a e parti ao ataque. Beijei-a. Ela bebia rum, enquanto eu traçava-a por trás. Deu um gole no rum e chupou-me, delicada, fugaz, ferozmente. Meu pau cheirava a rum. Eu urrava de tesão, na noite estrelada, que enxergava pela janela. Seu hálito estava contaminado pela bebida caribenha. Amei-a, como nunca naquele dia. Terminamos. Eu deitei-me ao lado. Ela fazia cafuné em meus cabelos, mau cuidado. Quando me vem à cabeça rum, lembro-me dela, e do sexo, sobretudo, daquela noite explosiva.

Passei no tão sonhado curso de Jornalismo. Faço faculdade, na PUC, em Goiás. Queria dizer para ela que consegui realizar o meu sonho Mas não avisei-a. Acho que nunca fui atrás, na verdade. Acomodei-me e deixa-a de lado. Esqueci que um dia tivemos algo. Só que a primeira mulher, não conseguimos esquecer. Nutrimos um carinho especial. Ela marcou-me profundamente. Ensinou-me a tratar as mulheres com compreensão, sutileza, cordialidade e gentileza. Queria do fundo de minha alma saber o que anda fazendo. Com quem está e como está. Se ler estas palavras, diga-me, porque significará muito. 

quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

TABACO, MORALISMO E ARTE

Conto histórias. O mundo gira ao redor delas. Não importa se é uma novela da Globo ou um conto. Todos se interessam por histórias. A vida é uma história. Vivemos, escrevemos poesia, contos, crônicas, romances. Hemingway tinha razão: escrevemos para duas pessoas: para nós mesmos e para a pessoa que a gente ama. A arte ajuda-nos a suportar as amarras e amarguras do cotidiano. O dia-a-dia impõe-nos rapidez. Não dizemos um “eu te amo”. Preocupamo-nos com bens. Dinheiro. O amor não tem espaço. A correria joga-nos ao pudor. Vestimos uma máscara e escondemo-nos atrás dela. E nem bebemos mais, porque soubemos que encurta a vida. Deixamos o cigarro de lado, por causa da incidência cancerígena. “Fumar, é coisa de idiota”, nos falam na rua, no trabalho, na faculdade. Em todos os lugares, a retórica é a mesma.

William Blake escreveu que a “estrada do excesso leva ao palácio da sabedoria”. Concordo. Exceder-se é fundamental para compreendemo-nos melhor.Não procure entender a embriaguez. Embriague-se, simplesmente. De quê adianta levar uma vida “sadia”, se um dia o relógio irá parar? Vivamos pela arte: como diz Nietzsche, ela priva-nos da realidade. Precisamos mentir, contar histórias, ouvir histórias. O mundo é movido por histórias, sejam boas ou más. Abra o livro, mas feche-o quando puder. Neruda o fez. Fechou-o para ir à vida. Viveu, lutou, denunciou as arbitrariedades dos poderosos, por meio da arte.

Não tenho medo da morte. Às vezes ela dorme do teu lado, calada.  Jim Morrison cantou que as pessoas são estranhas. Satre escreveu. Interpretou a mente humana, no início de sua carreira acadêmica. Morrison era poeta. Virou cantor, por ironia do destino, que surpreende-nos a cada instante. Quando achamos que sabemos, somos enganados. Abrimos o livro. Desvendamos linhas e pensamentos, cujo labirinto coloca-nos encontra a parede.

Eu vivo o presente. Porque a vida é bela. Tão bela e exata, que um dia acaba. Dispenso o futuro. Ele é distante. Não sei nem se chegará. Posso atravessar uma rua, e morrer. Meu coração pode parar de bater neste momento e terei de deixar este texto inacabado. Ninguém o terminará. Porque poucos pensam e amam a arte. Sinto-me insatisfeito com as injustiças. Quero repará-las. Nem que seja sozinho. Sinto que é o meu dever, como cidadão, futuro jornalista e amante das artes. Escolhi jornalismo para interpretar, ouvir e reproduzir histórias.

Vou a bar e ouço todos. Desde o “noiado” até o cara da mesa ao lado. Peço o isqueiro. Converso. Pergunto sobre a vida. Questiono o moralismo cético e barato que cerca-nos. Amo a vida, acima de tudo. Amo o sexo. Sinto nele uma forma de libertação da alma. Gosto de ver as mulheres no clímax. Muitos homens não dão a mínima pra isso.  Eu dou. Dispenso, revogo e repudio toda caretice. Digo não a mediocridade.

sábado, 17 de janeiro de 2015

Assim morreu Henry Miller

Assim morreu Henry Miller.

Não foi o álcool, como dizem os idiotas da objetividade, com a licença de Nelson Rodrigues.

Fernando sentara à mesa. Acendera um cigarro. Ele era mestre na arte da sedução. As mulheres caíram aos seus pés. Certa vez, chegara a ter 4 mulheres, em uma noite. Ninguém acreditava. Todos se perguntavam o que tinha o cara. 

Há tempos Fernando não conseguia escrever. Cagava umas 4 vezes por dia, por falta de ter o que fazer. Ia aos bares ficar bêbado, pela mesma razão. “Estou morto. Não consigo escrever porra nenhuma há algum tempo”, dizia.

Renata, moça atraente e compreensiva, perdera a compostura. Questionara-o sobre um emprego:

- por quê não arranja um emprego decente?

- e quem disse que existem empregos decentes?

- porra Fernando, minha avó ganha mais dinheiro do que você.

Fernando respirara fundo. Contara até 10 em sua mente. Abrira uma garrafa de cerveja. E conseguira retornar à paz.

- estou acabado Renata. Você não tem capacidade para entender isso. Hemingway morreu assim, sem 
inspiração. Sabe quem foi Hemingway? Aposto que não. Burra!

Ela optara pelo silencio.

Mas na verdade, Renata não sabia nada de literatura, nem de arte. Apenas gostava de ver Fernando aflito, bravo, melancólico.

- nem uma história de amor consegue criar. Seu mundo se limita a bares, bebidas e putaria. Seu babaca!

- querida, tenho de esperar, apenas. E se o negócio nunca chegar, irei descer-me até a rua e ir atrás de 
alguma boceta para foder.

Renata olhara dentro da retina esverdeada de Fernando. Ele ficara quieto. Abrira mais uma cerveja. E fora ao banheiro, cagar. “Que cara estranho”, falava introspectivamente Renata.

- vou-me embora. Você nunca criará vergonha na cara para procurar um emprego digno. Escrever não é para você. Quando irá se tocar?

Fernando dera um goele profundo em sua cerveja. Acendera um cigarro. E falara:

- vá!

- vou mesmo, respondera Renata.

Ele vira-a passar pela porta. Fora à janela olhá-la arrastar olhares efêmeros pela rua ,de homens ávidos por uma foda.

Em sua frente havia a máquina de escrever. Sentou-se à frente dela. Batera o primeiro parágrafo: “Renata viera a minha casa. Encheu-me o saco com palavras fúteis. Mandou-me procurar um emprego decente. 
Disse-lhe que nem Henry Miller procurara um emprego decente. Ele queria saber da arte. Amava a arte. A sua vida era a arte. Foda-se o resto”.

Fernando estava cada vez mais convicto de que o seu mundo era o da criação. Que emprego porra nenhuma!

segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

No bar

No bar
A lira dos teus olhos
Me espera

Teu pômulo
Posso vê-lo
Sorridente, intimidador;
Queria tocá-lo

No bar,
Sinto a suavidade
Da áurea romântica e sonhadora

Quero encontrá-la e beijá-la
Quando virar a esquina da paixão
E pegar em suas mãos e dizer:
"Meu amor, acompanhe-me ao paraíso"

Morrison e Whitmann
Sábios admiradores da vida
Na madrugada, teu canto lírico cativou-me;

Deixe-me ir ao teu encontro
Tocar-lhe, amar-lhe, apreciar-lhe
Como se o amanhã fosse distante
E os segundos contados 

sexta-feira, 2 de janeiro de 2015

Devaneios e delírios em uma manhã de ressaca

Ela sentou ao meu lado. Eu estava de ressaca. Havia bebido uma quantidade que o homem moderno desconhece. Sentia o meu corpo, mole e pesado ao mesmo tempo. Queria a minha cama. Mas não a tinha. O sol, torturava a minha retina. Odeio as manhãs, sobretudo quando estou mal. Ninguém é feliz às 6h40.

Fiquei parado, a pensar sobre a vida. Divaguei sobre a beleza e o conceito de belo. Veio-me à mente os devaneios nietzchianos. Para ele, precisamos da arte porque a verdade machuca-nos. Kant disse que o que é belo para mim, pode não ser belo para o outro. Assim o conceito de beleza torna-se relativo, dependendo do ponto de vista.

Caí na real. Estava viajando em pensamentos. Olhei a meu redor. Levantei-me e fui em direção dela. Perguntei-lhe:

- olá, tem como você me dar um cigarro?

Seus olhos entraram em mim. A principio fiquei com vergonha. Não sabia o que falar. Cogitei, por alguns segundos, em ir embora e deixá-la com o cigarro para trás. Mudei de ideia:

- tenho sim, respondeu-me, expressando gentileza e sutileza.

Dei uma olhada nos livros. Eram alguns sobre Comunicação e outros de literatura. Havia por ali, Proust, Hemingway, Fitzgerald e outros gênios das letras. Ela percebeu que eu olhava-os. E me disse, com ares de curiosidade:

- pelo visto você é fã de literatura, não?

- sou sim. Adoro textos. Adoro arte. Amo música. Para mim, o homem não poderia viver sem a arte.

- concordo, replicou ela.

Iniciamos uma conversa. O nível do diálogo era alto. Eu tinha de esforçar-me para lhe acompanhar. Ela citava livros, poetas, escritores. Eu recorria a discos, poetas, frases. Algumas, reconheço, não teve como lembrar. Outras, nem sei por que falei.

Terminei o cigarro. Mas ainda continuávamos a dialogar. “Eu preciso comer algo”, pensei comigo. Introspectivamente, eu queria ir em busca de algum salgado. Mas fisicamente, deveria ficar. Estava impressionado com a beleza dessa garota. Lembrei-me de uma frase de William Blake: “O corpo feminino é a mais beleza expressão artística”.

“Cara, vá comprar a porra do lanche. Você bebeu ontem, agora aguente os sintomas da ressaca. Eles vão lhe atrapalhar”, disse o meu consciente.

Por entre visões surrealistas, decidi: iria comprar o salgado, e voltaria para continuar a conversa.

- vou ali, comprar algo para comer, e já volto. Quer algo, lhe perguntei, sem segundas intenções e tentando firmar a voz.

- pode ir. Não quero nada, não.

Levantei-me e fui. Primeiro, caminhei em direção ao banheiro. Precisava olhar-me ao espelho. Meu rosto deveria estar todo vermelho, de pudor que tenho em grande quantidade.
“caralho, seu filha da puta. Como pode um cara ser assim? Ficar com vergonha de conversar com uma garota, e nem ter capacidade de manter a postura e a cordialidade? Porra!”, redargui, novamente, em outro exercício introspectivo.

Saí do banheiro.

Comprei dois salgado e um café. Comi-os e bebi. Acendi um cigarro. Dei algumas tragadas no ar, a refletir sobre a vida e o mundo que nos cerca. Parei de pensar. Precisava agir, talvez. Parar de ler, me diziam, seria uma boa. Os livros ainda iriam me deixar maluco, um cara me falou nas festividades de ano novo, certa vez.

Nem dei muita atenção. Queria era mesmo beber. E depois, me arrepender como corriqueiramente faço. Bebo e arrependo-me. Fumo, falo coisas indevidas. E depois, penso na frase de Cazuza: “Por que a gente é assim”.

Não sei a resposta. Se a soubesse, qual graça que teria a vida? A graça dela, não é ter autonomia para cometer erros? Os mesmos erros que hoje cometo, amanhã não os cometerei. 0

Mas eu quero errar. Eu tenho esse direito. Por isso gosto da boemia. Nela, sinto-me seguro e protegido da claridade diurna. O sol machuca-me. O pragmatismo iluminista, não gosto. Prefiro a poesia romântica repleta de excessos e amor.

Os mesmos livros que podem deixar-me maluco, ensinaram-me que o “inferno são os outros”. Satre era sábio. Sabia das cosias. Era preocupado com o mundo, com a sociedade, com as injustiças. Era o único velho em meio a uma multidão de jovem, em 1968, em Paris. Ali a utopia “paz e amor”, teve o seu ápice.

Sonho com uma sociedade justa e igualitária. Quem não sonha? Somente pessoas más. Quem tem coração, é de esquerda. Vota na esquerda. E se preocupa com as disparidades e arbitrariedades.

Gramsci tinha razão: “Viver é tomar partido”.

Chega de citações. Estou parecendo uma enciclopédia de filosofia e artes.

RETORNO

Controlei os meus devaneios. Cheguei ao banco em que estávamos. Ela não estava ali. Nem sinal seu, por perto, havia.

“Aonde ela estaria?”, pensei.

Sei lá. Talvez ela tenha se cansado de esperar, tem toda razão e direito, também. Eu que não deveria ficar divagando merdas por aí, como um otário.  

“burro, burro, burro!”

-Beck, cê tem que ir pra sala, cara, disse um camarada.

- é verdade, meu. Eu fiquei aqui, conversando com uma garota. Ela era linda, mas foi embora.

- então é por isso que não entrou na sala ainda?

-sim

- vamos!

Coloquei a minha mochila nas costas, e caminhei em direção às escadas. Iria assistir duas aulas, com uma ressaca cruel.

Empurrei a porta, e quem eu vejo: Ela.


Valeu enfrentar o martírio da ressaca.