Aluno de Direito da PUC parte para cima de
estudante de Jornalismo. No momento do bate-boca, ela segurava seu smartphone. O
rapaz acusou-a de “petismo"
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Marcelo Filho tem braço ferido em confusão. Foto: Blog Arquivo Direito |
“Só podia ser petista”,
esbraveja um estudante de Direito, com Vade Mecum em mãos. O sujeito
aproximou-se de Maria Luíza, estudante de jornalismo da PUC (Pontifícia
Universidade Católica), com o dedo em riste, as veias do pescoço saltadas e
agredindo o vernáculo, com todo o chulismo que lhes são marca registrada. Um dos
agressores, afinal, era fã de Jair Bolsonaro, a quem denomina como “mito”.
Na última quinta-feira, 31, a
Chapa 1 elegeu-se para comandar o C.A (Centro Acadêmico) de Direito. Não havia
opositores. E nem o livre debate, fundamental para o exercício da democracia ou
o Estado de Direito Democrático, que o agressor verbal e ameaçador se diz
reverenciar. A Chapa 2 – que seria a oposição aos “mocinhos” do Direito – foi
impugnada por “partidarização”. No tumulto, uma janela
foi quebrada e cerca de cinco alunos não podiam sair da sala. De acordo com
relatos, eles foram ameaçados.
Por alguns instantes, ficaram
trocando olhares. Parecia que a qualquer momento alguém daria o primeiro golpe.
E a pancadaria iria instalar-se sobre o pátio do bloco A, do Campus V da PUC. Ao perceber o
tumulto, caminhei em direção ao rapaz que empunhava o Vade Mecum. Antes que eu
raciocinasse qualquer coisa, um cara com óculos de grau redondo, brinco na
orelha, camiseta preta e calça escura encostou a testa ante a do agressor. Raphael Ribeiro, estudante de Jornalismo, estava no cenário do fato. Ele perguntou ao segurança o que havia acontecido. O sujeito não lhe disse nada
com nada, apenas enrolou, sem dar nenhuma explicação aceitável.
O integrante da comissão
eleitoral reverberou que não houve dinheiro de partido em sua campanha. A
baixaria corria solta, sem hora, nem local para acabar. Os gritos e xingamentos pareciam um show à parte, cujos atores eram estudantes, sem respeito,
compaixão, amor, sapiência e sabedoria. Ler, apenas, o Vade Mercum e encher os
bolsos de dinheiro não ajustará os problemas do Brasil. É preciso usar a
lógica, sem fanatismo, muito menos pedantismo elitista.
No último dia 6, essas mesmas
pessoas – acostumadas com os privilégios da Casa Grande e Senzala – saíram às
ruas para protestar contra a corrupção. Eles reuniram-se, com camisetas verde e
amarela da CBF (Confederação Brasileira de Futebol), em frente à Praça
Tamandaré, no Setor Oeste, e caminharam à Delegacia da Polícia Federal, no Setor
Marista. Gritaram e defenderam a Lava-Jato. "Deixem o Moro fazer seu trabalho", alardearam.
História
“Nosso maior patrimônio é a democracia.
Não temos de aceitar o golpe”, afirmou Orlando Afonso, no último dia 11, na
Faculdade de Direito da UFG, em ato contra o espírito golpista e reacionário
que toma conta do País. Segundo o reitor, tem-se de relembrar o golpe de 1964,
articulado pela FIESP (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) e
mídia, que levou João Goulart a renunciar.
Jango – como era conhecido o então
presidente – fizera discurso na Central do Brasil e prometera acelerar as
reformas de base. Alguns dias depois, acontecera a Marcha da Família com Deus
pela Liberdade que “defendia a democracia”. O desfecho todos conhecem. Foram
intermináveis vinte anos de ditadura, com muito sangue derramado e escondido
nos porões dos quartéis.
Em 2
de abril de 1964, o Jornal O Globo, em editorial, defendera o governo militar. “Graças à decisão e ao heroísmo das Forças
Armadas, que obedientes a seus chefes demonstraram a falta de visão dos que
tentavam destruir a hierarquia e a disciplina, o Brasil livrou-se do Governo
irresponsável, que insistia em arrastá-lo para rumos contrários à sua vocação e
tradições”, afirmava o veículo da família Marinho. Na televisão, a Globo
narrava o que interessava ao governo e vendia à sociedade a existência de um
milagre econômico.
Em 1984, no ápice das Diretas Já,
a emissora negou-se a cobrir as manifestações a favor da Emenda Dante de
Oliveira. A reportagem que fora ao ar no Jornal Nacional mostrava que a
população estava reunida na Praça da Sá para comemorar o aniversário da cidade.
No impresso, Roberto Marinho nem fez questão de esconder sua veia
antidemocrática. Em editorial, ele disse que o melhor ao país era continuar a
ditadura. O atual Diretor de Jornalismo da Globo, Ali Kamel, gabou, em A Globo não fez campanha, fez bom jornalismo,
da atuação da emissora na cobertura das Diretas Já.
“Não escrevo para elogiar o ‘JN’.
Escrevo porque, em uma daquelas chamadas, uma pequena imagem do repórter
Ernesto Paglia pode ter contribuído para rechaçar de vez uma das mais graves
acusações que o ‘JN’ já sofreu: a de que não cobriu o comício das diretas, na
Praça da Sé, em São Paulo. Uma acusação que está, inclusive, em muitos livros”,
escreveu.
Contexto político
Ronaldo Caiado sequer foi visto
em Goiânia, nas manifestações pró-impeachment. O deputado do DEM (Democratas)
prefere ir a São Paulo, na avenida Paulista do que jorrar seu reacionarismo em sua
cidade, capital do Estado que sua família mandou e desmandou no início do
século XX, e que nomeou Leonino Di Ramos Caiado ao governo do Estado durante a
ditadura militar. Os Caiados adoram um autoritarismo, sentem-se confortáveis na
tirania. Quanto mais para poucos, melhor.
Em 11 de março, o Partido dos
Trabalhadores (PT) e Movimentos Sociais – CUT, MST, Mtst, Fenaj – defenderam a
democracia. A mobilização começara na Faculdade de Direito da UFG (Universidade
Federal de Goiás) e contara com a presença do Reitor Orlando Afonso, do
prefeito Paulo García, da vice-presidenta regional da UNE (União Nacional dos
Estudantes) Deborah Evellin, além de líderes de movimentos rurais. Todos tinham
na ponta da língua ‘não vai ter golpe’.
Idolatrado por jovens direitistas,
o deputado federal Jair Bolsonaro coleciona sadismo político e intelectual.
Ex-militar, o parlamentar, todo ano, exalta o Golpe Civil-Militar de 1964. “O
erro da ditadura foi matar, e não torturar”, esbravejou. “Pinochet devia ter
matado mais gente”, disse, sobre a ditadura de Augusto Pinochet, uma das mais
cruéis do cone sul. O ditador chileno fez do Estádio Nacional do Chile um campo
de concentração aos moldes de Auschwitz, na Polônia, que incinerara milhares de
judeus.
Eleições do C.A
Em nota, a União Estadual dos
Estudantes (UEE) afirmou que repudia as eleições que aconteceram no Centro
Acadêmico Clóvis Bevilacqua (CACB). Para a entidade, a comissão eleitoral
dirigiu todo o pleito e beneficiou a chapa 1. “Nós, estudantes de Direito da
PUC-GO, repudiamos todo o processo de construção da eleição do Centro Acadêmico
Clóvis Bevilacqua (CACB), que ocorreu de forma antidemocrática, ilegítima e
tendenciosa”, escreveu.
Heitor Soares ficou preso dentro da sala por várias horas. Para ele, os opositores
não conseguiram inscreve-se e, por isso, tentaram impedir a eleição. Ele ainda
denominou-os de “petista” e disse que não defendem a democracia. “Nesta escola
política, além de ensinamentos filosóficos e sociais - que de nada servem, pois
não são utilizados - são ensinados também táticas de confronto físico, que nada
se aproximam do debate propositivo de ideias”, afirmou.
O estudante Marcelo Filho sofreu
um corte no braço direito e foi encaminhado ao hospital. Heitor Sores, amigo de
Marcelo, afirmou que a estrela petista brilha cada vez menos, e os militantes, por isso, partem à violência. “A estrela petista brilha cada vez mais fraca dando-os a
motivação necessária para atos unilaterais e violentos”, disse. “Não se enganem
por aqueles que dizem lutar pela democracia.”
“A União Estadual dos Estudantes
Goiás (UEE-GO) não compactua com a arbitrariedade como foi dirigido o processo
eleitoral do CACB e não compactua com a falta de democracia e diálogo com as
partes envolvidas. Repudiamos todo e qualquer tipo imposição de dirigentes no Movimento Estudantil”,
afirmou Suellem Horácio, vice-presidenta da UEE.
Reportagem originalmente publicada no Diário da Manhã, no último sábado.