domingo, 28 de agosto de 2016

Juro que tento

Juro que faço de tudo, mas não consigo. Juro que me esforço para acreditar que não se trata de um golpe, de uma tramoia articulada por tubarões, de uma manobra parlamentar. Juro que perambulo de site em site – inclusive gringos – para tentar entender o contexto político deste Brasil às luzes de 54 e 64. Juro que lá fora se fala o que aqui se esconde pra baixo do tapete. Vide o editorial do francês Le Monde: “A triste ironia do tombo de Dilma Rousseff.”

Nada de novo na capa dos – com licença, Mino Carta – jornalões e revistões tupiniquim. Os mesmos adjetivos e verbos clamam pelo golpismo, pela extinção de direitos trabalhistas conquistados à duras penas, estão lá. Juro que tentei entender, raro leitor, o diálogo patriótico entre Sérgio Moro e Romero Jucá e, asseguro, após a audição, que fiz como o dirty old man da literatura estadunidense, Charles Bukowski: golfei com gosto. Quem não golfa, diante de um cenário desses?

Por favor, ajudem-me: como aquele diálogo pode ser interpretado fora do xadrez do círculo golpista? Certamente, Jucá assumiria a criação do enredo golpista. O resto, você sabe. Pausa. Mais uma golfada. Que porre, hein, nobre cronista! Pois é, terceira pessoa, mas como não se embriagar com os charlatões bradando insanidades a plenos pulmões, que são propagadas pelos oligarcas da grande mídia, após aperto de mão ‘amigável’.

Tento entender a tese do impeachment, embora traumático e com a benção dos evangélicos e suas bíblias, mas juro que não consigo. O cenário político do Brasil retornou a agosto de 1954 quando os golpistas, impulsionados pelo ultra-conservador Carlos Lacerda, pressionaram Getúlio Vargas, cujo governo dava forças ao capital nacional em detrimento da dinheirama do outro lado do Atlântico e do Tio-Sam.

Juro que às vezes tenho impressão de que estou em O Processo, de Kafka, quando o protagonista, Joseph K, foi intimado a julgamento, sem nem saber o porquê. Todavia, tudo vai ser lembrado depois, como diria o cobrador, narrador de conto homônimo de Rubem Fonseca. Sabe aquele momento em que a ficção explica mais do que qualquer tese sociológica? Rubem Fonseca é assim. Guimarães Rosa é assim. John Steinbeck é assim. William Faulkner é assim.

Procuro entender, juro que procuro, como as delações são fracas quando os personagens atingidos é o Aécio Neves, é o José Serra – eterno protegido da mídia nativa (desculpe de novo, Mino) e é o Michael Temer – o poeta que deixaria Millôr Fernandes cabisbaixo. Aliás, os versos de Temer, mais uma vez me desculpe Millôr, seriam motivos suficientes para impeachment, num país sério.

É lamentável - juro que é - essa retórica elitista e golpista. Será que acordaremos apenas quando a pátria de chuteiras – agora com medalha de ouro na galeria de troféu – se transformar na pátria de calhordas e endinheirados (com o perdão da redundância, ops)? Quando os diretos trabalhistas, que o nobríssimo Flávio Rocha, dono da maior rede de vestuário Brasil, a Riachuelo, tanto repudia, forem para o beleléu? Quando abriremos os olhos?

Seu Flávio, recomendo-lhe, urgentemente, a leitura Da riquezas das nações, de um velhão, do Iluminismo, chamado Adam Smith. O cara pensou esse negócio chamado capitalismo, você acredita?

Leia-o com senso-crítico. Ah, não deixe, também, de passar os olhos por John Maynard Keynes – economista que tirara os EUA da crise de 1929. Keynes é conhecido como um dos pais do Estado de Bem-Estar social. Privatizações? Jamais. Keynes, um social-democrata por natureza, pensou um capitalismo justo e sério, e não um capitalismo de interesses.

Agora evoco os versos de Caetano, em Alegria, alegria: “O sol nas bancas de revista/ Me enche de alegria e preguiça/ Quem lê tanta notícia.”

Quem lê tanta notícia? Eu, porque neste contexto não tem outro jeito, não. 

quarta-feira, 17 de agosto de 2016

Terça-feira brava

Olho pela janela. Céu cinzento. Chuva e ar ameno. Acendo um cigarro e penso na vida. Ao me aprofundar na metafísica do ócio, quase desisto de ir à aula. O cigarro termina, jogo a bituca fora e decido banhar.

Abro as redes sociais. Perambulo por alguns sites de notícias. Começo pelo Estadão. Passo os olhos pela coluna de Arnaldo Jabor. Reacionário, ele, reconheço, escreve com ironia peculiar. Bom texto, tirando seu posicionamento político. Em seguida, leio o editorial de Carta Capital. Assim como Jabor, Mino também coloca algumas pitadas de deboche em seus textos. No Facebook, descubro que o velho Bukowski faria 96 anos, hoje (16), se estivesse vivo. Autor de Mulheres, Buk morrera aos 74 anos, de leucemia, em Los Angeles. Dirty old man da literatura estadunidense. Poeta fodido, o velho Buk.

Ontem, antes de dormir, por volta das 23h, fui surpreendido por um poema de Lua. Eu havia tecido a ela uma carta sentimental e carinhosa sobre seus escritos – dessas que estão em falta, na era tecnológica. Lúgubre, a noite ficara melhor, ao ler os versos dela. Ainda bem que Lua gostara de minhas linhas tortas, porque eu estava com a cabeça transbordando paranoias, já. Cheguei a cogitar a ideia de que minha carta tinha ficado uma preciosa merda.

Caminhando pelas calçadas, penso no roteiro que tenho de escrever. Cinema é foda. Não que seja complicado escrevê-lo, mas a tarefa torna-se porque o filme vai ser exibido na Tv Puc, que é uma emissora católica. Palavrões, nem pensar. Cenas escatológicas? Tá louco. Bebedeira, então, muito menos. Ao ponderar essas incongruências, começo a crer que ficarei sem texto, em algum momento da vida.

Minha escrita gira em torno da boa e velha esbórnia noturna. Escrever histórias civilizadas é complicado. O texto fica maçante, chato e forçado. Deve ser por causa dos meus critérios literários. Há tempos não leio ninguém “equilibrado”. Já os li demais. Agora, procuro o conforto dos predicados e verbos delirantes. Para me seduzir, a obra tem de ter algum maluco, bêbado ou drogado. Exceto Horizonte Perdido, livro que Lua me emprestou. Identifiquei alguns problemas na construção do personagem principal, Conway, mas o enredo é bem amarrado.

William Burroughs, Jack Keroauc, Lawrence Ferlinghetti, Rimbaud e Baudelaire. Os bons. Os loucos. Os que não propagam chavões por aí. Mas viveram, viveram a sarjeta que o capitalismo do primeiro mundo lhes fornecia.

Chego à faculdade. Ao descer a rampa que leva às lanchonetes, escorrego no piso molhado pela água da chuva e vou em direção ao chão. Bato as costas, violentamente. Devo ter fraturado umas duas vértebras da coluna. Uma moça que está ao meu lado não segura a gargalhada. Finjo que não é comigo, levanto e sigo minha caminhada. Um Nike, de R$ 150,00, quase contribui para partir-me o crânio ao meio, constato. Cogito a hipótese de arremessá-lo no meio da Fuad José Sebba.

Com pouco esforço, desisto desta insanidade.

Conto as moedas e compro um café.

Café e Marlboro vermelho são imprescindíveis para acordar, filosofo.

Resmungo algo, aleatoriamente. Porra, semestre passado eu pagava 75 centavos num copo de café, pela metade. Agora, inventaram que a bebida precisava ser reajustada. Fico pensando o preço que estará quando eu me formar.

Acomodo-me no chão. Tiro Assim falou Zaratrusta, de Nietzsche. À medida que vou lendo a obra, sublinho alguns trechos. Nietzsche é foda. Leitura que digere com certo empenho. Especificamente, em Assim falou Zaratrusta - seu livro mais poético -, Nietzsche discorre sobre os valores impostos pela cultura judaico-cristã. Vivemos sobre a batuta da bíblia, dos provérbios.

Com o pensamento a mil por hora, vou ao banheiro. Jogo uma água no rosto.

Ao sair, dou de cara com Zé.

“E essa roupa social?”, pergunto, jocosamente.

“Lancei”, responde ele, com um sorriso desonesto estampado à face.

O cara estava com uma camisa xadrez, calça jeans larga, de maluco, e um tênis que aparentava sinais de luta.

“Porra”, disse Zé. “Tava na aula de psicologia ali e a professora falou: “esse semestre vai?”. Fiquei sem saber o que dizer, cara.”

“Foda. Quem é a professora?”

“Mara Rúbia.”

“Grande Mara Rúbia”, murmuro.

“Grande Mara Rúbia”, repete Zé, com a voz de um tarado depravado.

Mara Rúbia é maravilhosa. Cabelos longos, lisos, escuros. Voz aguda, cujos ensinamentos de Freud fixam na mente. Mara Rúbia, por si só, já é um pretexto considerável para ir às aulas de Psicologia.

Compramos um palheiro. Demos uma tragada, cada um. Reclamamos da pouca qualidade do fumo que entra em nossos pulmões, deixando a voz grave como a de um velho que fumou, durante toda a vida, três maços de Hollywood vermelho todo dia. Sem contar na revolta que o Piracanjuba Ouro causa no sistema gástrico. Uma mistura bizarra de dor, fome e sede lhe ganha. Sem dúvidas, uma lúdica merda.

“Olha essa mima”, fala Zé.

“Quem?”, indago.

“A Michelle.”

“Gostosa”, digo.

“Ela posta umas fotos no instagram, do caralho, literalmente.”

“Se o cara tiver meio necessitado, senta em frente ao pc, abre o instagram da mima e punheta-se”, afirmo.

Zé ri.

Observação característica dos machos de outrora, a minha.

Olho o visor de meu celular: 9h. A segunda aula vai começar. Subimos à sala. Zé, que não assiste aula comigo por conta de alguns entraves em sua grade, iria absorver os conhecimentos teóricos do jornalismo com uma turma tipicamente de ensino fundamental.

Após findar a aula, encontro-o, para variar, bebendo água. Ele me convidou para darmos uma bola, saudavelmente.

“E o cantil?”, questiono.

“An...”, se faz de desentendido, o Zé.

“O teu cantil, cacete. Cê não trouxe, né?”

“Não, cara.”

“Por quê?”

“Beber cedo é foda. Me sinto um alcoólatra profissional, quando beberico o trem às 7h da amanhã, com a maconha na boca.”

“hahahahaha”, sorrio.

Em seu velho Nokia, Zé pôs The end, do Doors, para tocar.

Suficientemente chapados, resolvemos ir embora. Conosco, estava Gizelle – que a galera chama, carinhosamente, de Gi. Ao despedir-me dela, protagonizei uma cena lamentável. Meu cérebro e corpo não conseguiram entrar em um consenso. Dei-lhe um protocolar beijo nas bochechas, só que meu corpo travou e eu não consegui me inclinar para abraçá-la. Caceta. Que cara estranho eu sou, pensei.

Fomos em direção ao ponto. A linha 580, terminal Araguaia a Praça da Bíblia, demoraria cerca de dez minutos para passar. Zé, com pouca disposição de esperar o coletivo, sugeriu:

“Vamo de Uber”, disse ele.

“E a grana?”

“Grana? Que nada. Olho só, bicho. A gente entra no carro, pede pro cara nos deixar na Caixa, ali na Vila Nova. Aí, saímos e falamos que vamos ao banco.”

“Os dois?”

“Sim. Se ele falar qualquer coisa, a gente diz que cê vai junto porque caso meu cartão não passe o seu passa.”

“Ideia brilhante. Eu animo”, eu digo.

“Os motoristas são de boa. Não vai dar nada.”

“Além de que eles sabem se virar, cara. E outra: alguém tá ganhando grana demais, com esse negócio de Uber”, constato.

O quê é uma conta de Uber sem pagar? Meu Deus, aonde foram parar meus princípios humanísticos? O capitalismo me transformou em um animal deplorável, um fora-da-lei irremediável.

Acomodamo-nos no banco do ponto, fumamos o resto do palheiro e o ônibus, enfim, apontou na esquina. No coletivo, observo dois malandros. O primeiro está em frente a catraca. Penso em lhe estilhaçar todos os dentes pelo chão, mas não é preciso. 

Na Praça da Bíblia, Zé comentou:

“Motora queria dar uma de bom samaritano.”

“Hahahahaha. Zelador dos bons costumes.”

Os malandros pularam a catraca do coletivo. Inconformado, o motorista se recusou a arrancar o ônibus, o quê causou revolta nos passageiros.

Ao nosso lado, uma moça começou a conversar conosco. Ela conta sobre algum problema que houve com algum motorista, em algum dia que não conseguiu pegar o coletivo.

O 401 (Praça da Bíblia a Praça A) chega. Entramos dentro do ônibus. Milagre, o veículo não está transbordando gente. Indignada, a moça continuou a falar sobre a safadeza que o motorista havia lhe feito. Acomodei-me no fundo, porém aquela conversa roubava a pouca disposição que eu tinha. Sinceramente, não queria ouví-la. Então, saí, à francesa, e fui para a primeira porta do coletivo.

“Cê deixou a mulher falando sozinha?”

“Não. Só saí”, eu disse a Zé.

“Hahahahahaha”, riu. “Que cena bizarra.”

“Bizarra ou filha da puta, depende do ponto de vista”, falei.

“Escreva um texto sobre isso, meu”, sugeriu. “Vai ficar cômico.”

A moça era gente boa, até.       

Terça-feira brava.

quarta-feira, 10 de agosto de 2016

A música certa faz um carro sem gasolina se mover de madrugada

Gente por todos os lados. Malucos com camisetas de bandas de rock. E, no palco, um cara grita palavras, que pela altura do som, se tornam incompreensíveis. Este é o Goiânia Noise, que aconteceu entre 1 e 7 de agosto, no Centro Cultural Oscar Niemayer. A vigésima segunda edição do evento contou com atrações como Nação Zumbi, Sepultura e Black Alien. Milhares de pessoas foram prestigiar os três dias de rock e exposições culturais.

Era 19h. Estávamos entorpecidos pelo poderoso White Horse, de Zé.

“Cê tá com o teu ingresso aí, cara?”, perguntou Zé – o Dean Moriarty do Cerrado.

Desgraçado. Não está comigo, não. Meu ingresso ficou em casa, terei de voltar a pé para ir buscá-lo nas imediações do Criméia Leste e chegarei aqui, novamente, por voltas das 08h, resmunguei nas profundezas de minha psique.

Levantei o mísero papel, e mostrei-lhe. Ele deu de ombros, e disse:

“Porra, nunca é demais perguntar”, garganteou. “Cê é burro.”

“Burro?”, redargui. “Meu, me dá um cigarro.”

Ele esticou um Marlboro vermelho.

Cigarro que o doidão do Hunter Thompson fumava quando escrevia suas reportagens subjetivas e desvairadas. Em 1972, a Sport Illustred havia lhe escalado para cobrir uma corrida de motocicletas no deserto de Las Vegas. Como a cobertura jornalística convencional era impossível, ele mergulhara no “american way of life”. Thompson nunca entregara a reportagem sobre a corrida, mas, meses depois, aparecera na redação da Rolling Stone, com uma cerveja na mão, fumando sem parar e com uma série de manuscritos numa pasta. Em seguida, o texto fora transformado em livro. Intitulado de Medos e Delírios em Las Vegas, a obra se tornou um clássico do jornalismo gonzo – a forma mais louca de narrar uma história.

Zé vestia uma camiseta gigante do The Doors, cuja estampa era Jim Morrison. Somos fã de Jim. Descobri os poetas marginais através dele. Provavelmente, eu seria um sujeito estranho se não tivesse sido contaminado pelos versos de Rimbaud e Artuad. Os escritos me tiraram da zona de conforto, e me possibilitaram pular a janela e abraçar a noite. Lá fora, as pessoas eram mais alegres e felizes.

Jogamos os latões de cerveja fora. Nathália ainda bebia a sua, enquanto Zé foi caminhando em direção à entrada. Observei-o e xinguei-o, mentalmente. Ele entrou. Nathália, também. Fui barrado.

“O que você tem no bolso?”, perguntou o segurança.

“Celular”, falei, mostrando-lhe o dispositivo telefônico.

“E aqui?”, indagou, com as mãos em meu bolso direito.

“Aqui, bicho, é o meu isqueiro e carteira”, expliquei.

“Posso ver?”

“Claro”, eu disse, acendendo o cigarro com meu delicado clipper cor-de-rosa.

Ao tirar a carteira para mostrar ao segurança, minha identidade caiu no chão junto com a chave de casa e outros pertences.

“Pode ir. Bom show”, sacramentou o guarda-costas, com a feição espetacularmente feia.

Não é bom nem olhar muito para um cara desses, pensei.

Imediatamente, Zé começou a mexer o esqueleto. Era uma cena deplorável de se ver. Nathália, com mais coordenação motora e desenvoltura, conseguia acompanhar o ritmo alucinado que era tocado no palco. Eu apenas ouvia ruídos ensurdecedores de guitarra elétrica, e não conseguia identificar se era Punk, Hard Rock ou metal.

Olhei para o meu lado. Três homens de mais ou menos uns trinta anos estavam parados. Eles tinham o semblante fechado. Pouco sorriso no rosto. Segui em frente, e Zé teve a brilhante ideia de comprar uma cerveja.

“Quanto é a breja?”, perguntou Dean Moriarty do Cerrado.

“Heineken é 10”, respondeu a moça.

“10?”, certificou-se, espantado, Zé. “Não tem outra, não?”

“Tem.”

“Qual?”

“Kaiser.”

“Quanto é?”

“5.”

“Me dá três.”

A moça escorregou a ficha sobre o guichê e, enquanto isso, a outra caixa deixara cair seus equipamentos de maquiagem. Demos uma amigável risada, e viramos as costas.

Dei uma olhada em meu celular. Era 21h. Aproximamo-nos do palco. Os curitibanos do Hillbilly Rawhide mandavam um country rock e rockabilly ao melhor estilo Johnny Cash. Geralmente, as histórias das letras se passavam nos Campos Gerais - região metropolitana da capital paranaense. Pelo menos não ouvíamos algum guitarrista demente mandar power-chords infantis - que mais parecem serem tocados por uma criança que faz aulas de guitarras com algum professor pirado.

“Hoje eu acordei/bebi tanta cachaça/que não consigo me lembrar”, cantou Mutante Cox, vocalitsta do Hillbilly Rawhide, desenhando alguns acordes em sua cansada Stratocaster vermelha, que parecia ter sido tocada por algum blues man nos anos 50.

A apresentação dos paranaenses acabou. Zé, Nathália e eu fomos para o outro palco, onde acontecia uma batalha de rap. Não se trata de meu gênero musical predileto. Algumas canções repudio tanto pelo ritmo, que qualquer ser humano é capaz de tocar, como pelo conteúdo das letras. Sim, não se pode generalizar e afirmar que todo rap é horrível. É como Beatles: algumas canções são boas. E ponto.

Ficamos por lá alguns minutos. Avisei aos amigos que iria ao banheiro. Eles disseram que permaneceriam em frente ao palco. Ao voltar, constatei que eles estavam no mesmo lugar. Isso que é solidariedade ao amigo, pensei. Após alguns minutos ouvindo aquela verborragia inenarrável, resolvemos sair.

Quanto tempo falta para o show do Nação Zumbi? Uma hora? Teríamos de esperar sessenta minutos para, enfim, vê-los. Eu já sentia o álcool correr pelas minhas veias, chacoalhar as membranas de meu cérebro e me fazer ter outra percepção sobre as coisas ao meu redor. Estava em uma linha tênue entre a embriaguez honesta e civilizada, e entre a inconveniência.

“Mais uma?”, me perguntou Zé.

“Opa”, murmurei.

Zé trouxe duas latinhas.

Ficamos conversando. Ora nos falávamos. Ora nos calávamos. Eu e Zé sabemos o momento em que temos de ficar quieto. Deve ser por isso que somos amigos. Em algum ponto da bebedeira calamo-nos e ficamos apenas viajando no emaranhado dos pensamentos. E Nathália, inebriada pelo furor etílico, também contemplava o silêncio. Laconismo nunca foi problema conosco.

Neste momento, passara por mim uma garota de cabelos ruivos que me despiu o bom-senso. Eu queria levantar e ir em direção a ela, e dizer a amava. Depois, decidi que não seria interessante sair feito um maluco depravado atrás de uma beldade. A moça teria acompanhante, certamente. Imagine arrumar uma confusão vinte minutos antes de começar o show do Nação Zumbi. Eu pularia no meio da galera com o olho roxo, mesmo. Isto não seria favor primordial para eu ir embora, nunca.

Dean Moriarty do Cerrado bebia sofregamente. O imbecil, ainda, se movimentava em meio a multidão de uma forma frenética e esquisita. Mas Zé não está nem aí. Ele tem um senso de indiferença invejável, por isso comparo-o ao mítico personagem de On The Road, Dean Moriarty. Também sou indiferente, porém preocupo-me demais com certas pessoas e situações. Eu deveria fazer como Zé: chutar a barraca.

O aguardado show do Nação Zumbi começara. Senti o primeiro acorde ser tocado pelo guitarrista Lúcio Maia. Não era nenhum clássico do primeiro disco, Da lama ao caos, de 1994, mas era uma boa canção para se ouvir bêbado, de madrugada, num festival de rock. Estava dentro dos conformes. Há uns seis, setes metros, Zé pulava e gritava palavras impronunciáveis.

Quando retornamos à realidade, era 5h da madrugada. Zé loucão. Eu pior. E Nathália, com o semblante de quem iria dormir em algum ponto do trajeto para a casa, tentava manter-se em pé. Nós três pegaríamos a mesma condução: o novo e eficiente Uber. Agora, os caras aceitam dinheiro. Facilitou demais a vida dos boêmios invertebrados, Brasil afora.

“Me empresta o teu celular”, pediu Zé.

“An...”, resmunguei, com a voz arrastada de cerveja e uísque.

“Me empresta o teu celular, porra!”, bradou, com o timbre de voz desnecessariamente alto.

“Não sou surdo, cara”, reclamei. “Pega essa merda”, eu disse, passando-lhe meu humilde Samsung.

Temos modernos. Se você pensar, há dez anos era um pouco mais complicado voltar para a casa, após uma noite de bebedeira ou show. Havia duas opções aceitáveis: ou esperava o primeiro ônibus, às 5h30, ou pagava um taxi. E, na pior das hipóteses, ligava para o pai. Hoje, não. Com um smartphone, chama-se um Uber e vai para a casa, confortavelmente. É a evolução.

Sabiamente, Zé pôs Somedoby to love, do Jefferson Airplane.

Música sempre foi um combustível para mim. Quando escrevo meus textos, tenho o rádio ligado no último volume. A música certa faz um carro se mover, sem gasolina, de madrugada. Zé sabia o que se passava pela minha cabeça, e tratou de colocar a voz flamejante de Grace Slick, no alto falante do celular, que me movimenta pela noite que insistia em ir embora.

Zé levou um cigarro à boca, e passou o maço a mim.

Entramos no carro. Era um Siena, em bom estado de conservação. O motorista logo se apresentou:

“E aí, galera?”, saudou Lincon.

“Beleza”, dissemos.

“Vão pra onde?”

“Vila Nova”, falou Zé. “Mas antes tenho de passar num banco pra sacar uma grana.”

“Sossegado”, falou o cara.

Lincon ligou o carro. No rádio, um som depressivo e indecente, que não sei identificar, tocava.

“Bicho”, disse Zé. “Tem como cê mudar de música?”

“Tá ruim?”

“Sim”, respondi.

Lincon mudou a estação do rádio. Ouvi um blues. Pedi para deixar. Na Executiva, Smokestack lightning, do Howlin Wolf, entoava.

Blues é bem melhor. 

sexta-feira, 5 de agosto de 2016

Deixo com Baudelaire

Eis que numa tediosa tarde de quarta-feira chega um pequeno poema em prosa de Lua.  Ansioso, cliquei no arquivo. Na primeira frase, me surpreendi. Na segunda, me segurei na cadeira. E na terceira fiquei boquiaberto. Era um daqueles poemas que me fez lembrar de Anais Nin – escritora francesa que inspirara Henry Miller a escrever seu primeiro romance, Trópico de Câncer.

Lua, saibas que conseguiste me inebriar com a poética e o charme de tuas frases – muito em falta nesses tempos em que a moral e os costumes são propagados aos borbotões por charlatões cristãos. Hoje, vivemos sob a égide da bíblia. Falar de sexo? Tá louco, seu cronista! Descrever o clímax – o momento dos momentos, como disse Hemingway? Nem pensar!

O sexo se tornou uma prisão. Acostumados com máquina de masturbação há apenas um clique de distância, os jovens praticamente perderam o interesse pela copulação. Não há o jogo, a conversa, a sedução, o mistério, o olhar. É tudo fático e frívolo. E quando vão pra hora agá, tentam repetir os célebres ensinamentos da brasileirinhas.

Criou-se uma geração homens que são sabe transar. Que imaginam que o clitóris seja o nome de alguma banda emo. E que vivem com a cabeça recheada de merda, com pouca poesia, com pouco assunto; e com muita, muita sacanagem barata.

Eles querem o carro do ano, o relógio do momento, a roupa de grife; eles querem bradar que “comeram aquela gostosa”. Todavia, no amor se deve despir-se deste materialismo petulante e, simplesmente, entregar-se à parceira.

Ah, Lua, tu tens fogo e paixão. Tu tens alegria e calor. Tu tens, Lua, a vida, o desejo, a vontade de celebrar a existência. Nietzsche escrevera que o homem não conseguirá mudar o mundo, e sugeriu que saíamos de casa e o abracemos e celebremos o prazer.

Lua, tu és a poetiza que não está em nenhum livro.

O mundo é grande, mal e intenso. Costumamos piscar os olhos e perder momentos importantes. A música vai parar. O poeta vai fechar o livro. O músico vai esquecer a nota. Viva a vida. Abrace o sol. Jogue o celular na parede. Grite o nome de alguma mulher às três da madrugada, bêbado – de preferência. Viva, cara. Plena e unicamente, embriague-se no emaranhado feminino. E lembre-se: é bom contemplar uma mulher chegando ao clímax.

Ouça Serge Gainsburg. Aliás, Lua, tua descrição resgatou em minha comprometida memória o clássico Je t´aime moi non plus. À época, o feioso do Gainsburg era casado com a beldade da Jane Birkin. No final da canção, Birkin simula um orgasmo num dos momentos mais belos das artes nos anos 70. Trilha indispensável entre quatro paredes.

Lua, agora deixo com Baudelaire: “Quando, cerrando os olhos, numa noite ardente/ Respiro a fundo o odor dos teus seios fogosos/ Vejo abrirem-se ao longe litorais radiosos/Tingidos por um sol monótono e dolente.”

Poetiza, tu és sublime.


terça-feira, 2 de agosto de 2016

Essência da literatura bukowskiana

Capa da edição que foi lançada em 2011
“Eu tinha cinquenta anos e há quatro não ia pra cama com nenhuma mulher”. Esse é Henry Chinaski, poeta, bêbado, alter-ego de Bukowski e protagonista de Mulheres. No Brasil, a obra foi traduzida por Reinado Moraes – autor dos clássicos Tanto faz e Pornopopéia - nos anos 80. A LP&M a relançou, em 2011.
Rotulado como obsceno, Bukowski não poupa palavras fortes, nem situações inusitadas em Mulheres. Ele escreve sobre a vida de forma lírica e coloquial. Sua mensagem é para os excluídos, para os inconformados, para os loucos, àqueles que sabem que poucas coisas - ou nada - valem a pena na vida.
Após um período de jejum sexual, Chinaski conhece Lydia. E April, Lilly, Dee Dee, Mindy, Hilda, Cassie, Sara, Valeire. Não importa o nome delas. Ele entra em suas vidas, e chacoalha-as, enlouquece-as, rompe corações, as faz sofrer. Mas no fundo, elas ainda acham-no um cara decente.
Em Mulheres, Chinaski é um poeta que começa a ser reconhecido pelos seus poemas. Então, ele passa a colocar em prática todas as fantasias sexuais que lhe foram reprimidas na adolescência e juventude. Várias entraram na vida dele. E saíram. E houve choros. E lágrimas escorreram das frases diretas e objetivas do mestre Buk.
Durante uma entrevista, nos anos 80, Bukowski foi questionado sobre Mulheres ser um livro machista. Com estilo, disse: “Você não lembra da parte em que eu sento na cama e choro?”, respondeu, fazendo alusão a cena em que ficou em dúvida com qual delas passaria as festividades de final de ano.
Publicado em 1978, Mulheres é a essência da literatura bukowskiana. Com o velho Chinaski, Buk fala para aqueles que se sentem à margem. “Ficção é a vida melhorada”, diz.

Epopéia quase pornográfica



Capa da obra
O escritor Reinaldo Moraes publicou, em 2009, o romance Pornopopéia. A obra foi lançada pela editora Objetiva, e narra a estória de Zeca - um cineasta marginal que vive à base do improviso. Regado a sexo, drogas, divagações literárias e devaneios beatnik, o romance é considerado um dos melhores livros escritos nos últimos anos.
Como o próprio nome já indica, Pornopopéia é quase uma epopeia pornográfica. Dividida em duas partes, a obra é bem trabalhada, sendo a primeira com diálogos, cenas e ações que se passam no submundo da cidade de São Paulo. A outra parte, no entanto, relata Zeca refugiado em Porangatuba, no litoral paulista, após se ver envolvido em morte traficante.
Logo no primeiro capítulo, o leitor é apresentado ao protagonista, um anti-herói pirado e anárquico. Ele bebe, fuma, cheira cocaína, não é chegado ao trabalho, não demonstra afeto com a esposa e nem com o filho. ”Vai, senta o rabo sujo nessa porra de cadeira giratória emperrada e trabalha, trabalha, fiadaputa”, diz Zeca, na primeira frase do livro, enquanto enfrenta uma crise de ‘inspiração” por não conseguir escrever um roteiro para comercial.
Em 2007, a editora Companhia das Letras empacou um dos contos de Reinaldo Moraes. O texto descrevia uma suruba numa sala de ioga, inclusa em Pornopopéia. Luis Schwarcz, editor da Companhia das Letras, sentiu-se incomodado com o personagem. Mas a dúvida dele acabou virando a de Reinaldo. E quatro anos depois, Zeca apareceu e destilou sua sapiência ao longo das 584 páginas de Pornopopéia.
Ao escrever a epopéia, Reinado Moraes não pensou no leitor. Segundo ele, durante a escrita chegou a crer que ninguém iria editá-la. "Estou botando tanta maluquice nesse livro, que ninguém vai editar”,disse o escritor, em entrevista ao Jornal da Biblioteca Pública do Paraná.
Reinaldo, também, foi tradutor de Mulheres – clássico de Charles Bukowski. Em entrevista, ele lembrou que quando o traduzia, alguns episódios pareciam de ter saído das páginas do Velho Safado. “Um vez eu estava sentando numa padaria, lendo jornal. Aí, apareceu uma mulhere de salto alto, que parecia ter pulado das páginas de Bukowski. A gente foi parar num motel vagabundo”, descreveu.
O último romance de Reinaldo fora Tanto Faz, lançado em 1982. 

segunda-feira, 1 de agosto de 2016

Ela

Abri os olhos. Fui correndo pra geladeira. Caí matando numa cerveja gelada. Puta ressaca. Boca seca. Cabeça explodindo. Dei o primeiro gole. E, em seguida, veio um arroto formidável de barítono bêbado que me evocou o destilado duvidoso que ingeri na noite anterior. Janela aberta. Gosto do calor.

Tirei a camiseta. Acendi uma baga, que estava em excelentes condições de uso. Entre cotovelos, meu computador. Companheiro de guerra. Pito tranquilamente, queixo caído, náusea violenta, pensamentos a mil por hora. Puta merda. Lembro-me de alguns fleches de ontem. Dou uma gargalhada estridente. Num determinado ponto da embriaguez, saquei a mandioca e dei uma longa mijada. Na marginal, alguns carros passavam. Certamente, uns pingos de urina respingaram no capô dos automóveis lá embaixo.

Como medida pra amenizar a ressaca, coloco The Doors. The spy, do Morrison Hotel. I'm a spy in the house of love/ I know the dream, that you're dreamin' on.

Penso em Lua. Que mulherão. Olhos de ressaca, sinuosos, poderosos; um verdadeiro fogaréu que lhe rasga a alma ao meio. Ela conversa contigo fitando-lhe os olhos. É foda. Dá uma vontade incessante de beijá-la. Na verdade, é a única coisa que lhe passa à cabeça. Pelo menos na minha.

“Je vais et je viens/ entre tes reins.”

Lua tem aproximadamente um metro e sessenta e cinco de puro pecado. Corpo esculpido a dedo. Pele dourada realçada pelo sol carioca. Lua carrega um quê pecaminoso e sublime. Ela sabe de seu poder. E não a faz a mínima questão de escondê-lo. Vive a vida a rir, a amar, a aproveitar. Quando vê alguma injustiça, comporta-se como se fosse apunhalada pelas costas. Sinto-me seguro em sua companhia. Procuro saber o que pensa, o que sente, o que gosta de fazer, o que não gosta de fazer. Lua tem uma alma loucamente livre.

Com o tempo, a gente descobriu algumas diferenças que devem ser consideradas - principalmente relacionada à música. Ela, por exemplo, adora Beatles. Eu prefiro Doors. Mas isso não impede que tenhamos um diálogo interessante. Lua aproxima-se da ideia de perfeição. Ela lembra-me de uma frase de Truffaut – o cara que filmara L'Homme qui aimait les femmes. “O andar feminino equilibra o mundo”, diz o diretor, através do protagonista, Bertrand Morane. Com Lua é um pouco diferente. Não é o seu andar que equilibra o mundo. É o seu olhar. Pensando bem, seu andar também contribui para harmonia do planeta. Eles guardam uma magia calorosa e misteriosa. Sempre fico retraído ao vê-los. As palavras somem de minha boca, e tudo o que consigo fazer é olhá-la e venerá-la e contemplá-la. Se eu pudesse passar a minha vida toda a mirá-los, eu seria o cara mais feliz do universo. Os versos de Vinícius de Moraes passariam a fazer sentido. Talvez Vinícius tivesse escrito poemas melhores, se os tivesse visto. Eu os vi, mas não consegui escrever nenhum poema decente até agora.

Corriqueiramente, ela me mostra seus poemas. Sim, Lua escreve. E incrivelmente bem. Os textos, sobretudo as poesias, carregam um lirismo amável e poderoso. Tenho vergonha de mostrar-lhe o que escrevo. Meus textos são repletos de escatológicas divagações existenciais. Uma grande merda. Só farra, deboche e putaria. Os textos de Lua, não. São diferentes. Ao lê-los, sinto como se eu tivesse entrando aos poucos em sua intimidade. Quando findo a leitura, faço alguma observação aqui e ali. Todas desnecessárias. E, às vezes, teço alguma crítica mordaz e me arrependo.

Escrever é foda.

“Aprendi muitas coisas contigo”, me disse ela.

“Sério?”, falei, surpreso. “O quê, por exemplo?”

Meu coração dava inúmeros pinotes em meu peito.

“Você me ensina várias coisas, e não só sobre poetas mortos.”

“Poesia é o combustível da vida.”

Lua deu uma gostosa risada, e continuou:

“Concordo contigo em uma coisa”, disse ela.

“E em que é?”, perguntei.

“Doors é uma boa trilha sonora pro sexo”, ruminou, com seu olhar sensual, sublime e sedutor.

“Hahahahaha. O melhor disco é L.A Woman”, conclui.

Criatura encantadora, a Lua.

Terminei a ponta.

Peguei Viagem ao fim da noite e fui pra cama. Comecei a ler, e dormi. Acordei com o barulho do telefone. Levantei-me, entre resmungos e xingos, pra atender.

“Alô”, falei.

“Opa, bicho. Como vai?”, perguntou Zé.

“Ressaquiado”, informei.

“Não anima de beber uma hoje?”

“Nem fudendo”, eu digo, colocando o telefone no gancho.

Camarada bêbado.

Só eu e uns três caras em todo o planeta devem usar um telefone fixo. Até tenho os aplicativos de comunicação. Mas evito usá-los. Prefiro me comunicar olho-a-olho, sobretudo com as mulheres. Atualmente, cê chega em casa de madrugada, bêbado, e o celular fica apitando. É impossível dormir. Um sentimento de indignação e inconformidade me toma. Um aparelho eletrônico falando comigo. Absurdo!

Voltei a dormir.

Entreguei-me ao sono como uma moça se entrega ao amante. Novamente, fui acordado. Ao abrir a porta, com palavrões à mente, deparei-me com Larissa. Antes que eu jorrasse algum comentário jocoso, inoportuno e idiota, ela perguntou se podia entrar. Sem possibilidade de recusa, aceitei.

“Tá tudo bem contigo?”, pergunta ela.

“Mais ou menos”, eu digo.

“Por quê?”

“Bebedeira homérica ontem”, murmuro, com a voz embargada.

Larissa acomodou-se em meu sofá. Fui até a cozinha. Como eu não havia oferecido nada pra beber, retornei à sala e perguntei:

“Quer beber algo?”

“Sim”, disse ela.

“Tenho um vinho. Pode ser?”

“Sem dúvida. “

Peguei um copo espetacularmente deselegante de requeijão. Era o único que estava limpo. Enchi de vinho.

Fui até meu quarto. Peguei um baseado.

“Eu assisti um filmaço”, conta Larissa. “É um clássico do Godard, Jule et Jim.”

“Pode crer. Tô ligado. Do caralho mesmo, Lari”, falei.

“É lindo. Os dois amigos vivem um triângulo amoroso. Eles se apaixonam pela mesma mulher.”

Acendi o baseado. Dei a primeira bola e quase morri de tossir. Bagulho bom, pensei.

“Larissa, tenho uma curiosidade: como tá a tua situação com o Zé?”

“Cara, o Zé é foda. Ele sempre chega lá em casa de madrugada, inebriado de cerveja, maconha e arte. Aí, toma um banho e a gente fode até alguém cair no sono. Pela manhã, um love rápido e “me liga e que eu te ligo. Pode ser?”, relata.

O baseado acabou. Eu estava fumado e meio bêbado. Larissa falava sem parar sobre música e cinema. Eu a escutava, desatento.

Indaguei:

“Cê tá com fome, Lari?”

“Sim. Esse baseado laricou.”

Fui pra cozinha. Abri a geladeira. Porra nenhuma. Só salada e bife. Vou fazer uma saladona, um bifão e já era.

Coloquei a mão na massa.

É impressionante como uma mulher admira os dotes culinários de um cara.

Ontem, na calada da noite, Larissa me aparece aqui. Eu estava no meio daquela soneca pós-bebedeira. Comemos uns bifes, queimamos unzinho e bebemos um vinho tinto. Larissa me contou sobre sua primeira trepada. Geralmente, primeira vez de mulher é muito mais interessante que a de homem. Elas não contam sobre suas aventuras com prostituas ou empregadas. Nada contra essas mulheres. Inclusive, essas damas deveriam desfilar sobre a cavalaria da Polícia Militar no centro das principais cidades brasileiras. Bem, as histórias que são garganteadas por aí não passam do convencional. Por isso minha indignação.

Larissa se empolga. Fala com grandes gestos. Zé não estava por perto pra monopolizar a conversa. Ela se mostra uma grande contadora de causos. Fica menos elegante e mais safada. Diz:

“A história toda começou quando eu tinha uns quinze, dezesseis anos e conheci Zeca numa festinha da escola. Ele não tinha nem um atributo. Era magro, feio e quebrado. O cara não tinha grana pra comermos um sanduba na esquina. Mas Zeca tinha lábia. Sabia as palavras como poucos. Tinha uma enciclopédia de literatura dentro da cabeça. Dizia que já tinha lido Machado de Assis, José de Alencar e Lima Barreto...”

“Porra”, brado. “O sujeito era responsa.”

“Responsa? Ouça só, Beck: A gente ia pra escola todos os dias. Eu contava sobre minha vida. Ele falava sobre a dele. Fumava uns três, quatro cigarro no caminho do colégio. Aí, a gente se encontrava no intervalo. Tínhamos apenas quinze minutos pra conversarmos. E dava tempo. Ele falava sobre música. Ah, como eu adorava vê-lo discorrer sobre as principais bandas de rock...”

Larissa enche o copo. Acendo um cigarro, e comento:

“Tô começando a gostar desse tal de Zeca.”

“Um dia fomos prum show, acho que do Capital Inicial ou Velhas Virgens, não me lembro bem. A gente nem bebia. Éramos bem inocentes. Aí, uma hora resolvi ir ao banheiro. Encontrei Zeca dando o maior amasso na minha melhor amiga na época, a Caroline.

“Que filha duma puta esse cara, Lari”, redargui, apagando o cigarro no cinzeiro transbordando bagas.

“Escuta só... Então, saí de perto. Fui curtir o show. De repente, eles voltaram. Eu estava, pra te dizer a verdade, com um puta tesão no Zeca.”

“Sei como é”, falo. “Eu também morro de apreço pelos excluídos, pelos feios.”

“Cê é mesmo um palhaço, Beck”, disse Larissa, sorrindo. “A gente foi embora. Não rolou nada. Aí, na segunda-feira fomos normalmente pra aula. Quando ele falava qualquer coisa, eu dizia algo pra não deixá-lo com cara de paisagem. À tarde, ele foi à minha casa. E entregou um cd com algumas músicas, músicas que eram as preferidas dele. Todo mundo no colégio ouvia rap. Alguns curtiam MPB. Puta caretice, saca? O pessoal só curtia quem falasse dos problemas do Brasil e essa merda toda. Era uma coisa típica de adolescentes revoltados. Sinceramente, Beck, curti pra caralho a lista de músicas do Zeca... Before you slip into unconsciousness... lembra?

“Porra, lógico”, exclamo. “É Doors, The Crystal Ship, do primeiro disco. Discaço, por sinal.”

“Sim”, fala Larissa.

“E o que rolou?”

“Eu fui pro meu quarto. Liguei o som e pus o cd pra tocar. A primeira música era Good Times, bad times, do Zeppelin. Puta som pesado da porra. Mas era diferente. Era um som vivo, saca? Eu nunca tinha ouvido nada parecido. Meus pais curtiam a boa e velha MPB e essa chatice toda.”

“O Zeca te apresentou pra modernidade, Lari. Era como descobrir Tom Jobim e Vinícius de Moraes, nos anos 50”, comento.

“Aí, havia uma música do Doors, The Spy. Lembra? I'm a spy in the house of love. Eu ouvi duas, três, quarto vezes. Achei a canção super sensual. E comecei a acreditar que as coisas eram inocentes entre a gente.”

“Nada é inocente entre um homem e uma mulher. O cara sempre pensa em comer quem ele conheceu e ela sempre pensa em foder com quem conheceu”, fraseio.

“Negativo, Beck”, Larissa começa. “Isso é somente contigo e com o Zé.”

“Porra”, rumino.

“Falocêntricos, isso que cêis são. Deixa eu continuar aqui. Aí, decidimos sair no final de semana. Coisa boba, de adolescentes mesmo. Fomos numa pizzaria. Conversamos e conversamos. Então, na hora de ir embora, eu achava que teria apenas aquele beijo protocolar. Me enganei. Ele me puxou e me deu um puta beijo! Aí, eu senti seu pau duro dentro da calça jeans roçando contra mim. Gostei. Peguei e apalpei aquele troço. Aí, ouvi um leve gemido. Quando olhei pra sua calça, havia uma marca bem ao meio. O cara tinha gozado. Cê acredita? Aí, eu falei: “Vamo, outro dia a gente continua.” Ao entrar em casa, fui direto pro quarto. Coloquei The Spy, e quando Jim começou a cantar I know the dream, that you're dreamin' on eu me… eu me masturbei. Me masturbei ouvindo Doors.”

“Que lindo”, elogio.

Larissa terminou de contar a história de como fora a sua primeira gozada. Ao terminar, ela olhou pro relógio, e disse:

“São 3h. Preciso ir embora, urgentemente.”

Deu-me um leve beijo na bochecha e saiu.

Mulheres...

Folheei Ofício de Viver, do Pavese. Sublinhei algumas frases:

“Fazer poesia é como trepar: a gente nunca sabe se alegria será partilhada.”

Caí na cama.

Angustia matinal. Olhei pela cortina. O dia estava cinzento. Parecia Curitiba, nessa merda.

Eram 13h. Sempre saio da cama depois das 12h. É o segredo pra minha bem sucedida existência, pondero. Pra minha e a dos gatos. Os felinos passam a maior parte do dia dormindo. Não tem preocupação. Por isso são bonitos.

Fritei alguns bifes. Fiz uma salada de alface e tomate. E enchi meu copo de rum. Era um rum vagabundo, de 15 paus, que desceu arranhando a garganta.

Com a barriga cheia, peguei alguns poemas do Chacal. Dei uma foleada. Grifei alguns, caso eu queira ler depois. Veio-me a imagem de Lua em minha cabeça:

“Seu olhar nunca é
De via lata carente
Nem é feito de ameaça
Pastor domingo na praça”

Vodca na geladeira. Maços de Marlboro espalhados pela mesa. Retratos de Jim Morrison e John Lennon pendurados na parede. Larissa me chamou pra beber uma, de leve, em seu apartamento.

“Imagina um bofe vivendo aqui? Ter de dar satisfação e essas merdas. Dividir comida. Transar com a mesma pica todos os dias. Não, não, não”, discorre a anfitriã.

Bofe. Recuso-me a ser denominado como tal. Mais pela fonética do que pelo significado, que, aliás, não encontrei até hoje. Larissa, como toda boa esquerdista, tem suas gírias. Ela chama todos de bofe, de Keith Richards a Paulo Leminski. Seja lá como for um bofe, considero-me delicado e sensível demais pra ser chamado de um troço desses. Quando soube do meu descontentamento com o vocábulo, Larissa deu uma de suas risadas diabólicas, que fazem a gente se mexer um pouco na cadeira e perder a linha de raciocínio.

Se tiver luz acesa, entre para um papo no apartamento de Larissa. Geralmente, a galera que está presente é um bando de intelectuais reclamando da vida, do mundo, das pessoas, da música, da literatura – mesmo sem dominar os velhões da prosa contemporânea -, do cinema. Eles só falam de anarquismo, comunismo, revolução, revolta. Às vezes rola um chororô também. E se não há motivo algum, eles se doem sem um motivo concreto. E tudo embalado ao som de jazz. Ou Tim Maia – os discos do começo da carreira -, ou Tom Jobim, ou Roberto Carlos. De vez enquanto, pinta até os blues carioca de Ângela Rô Rô.

Em certa altura da embriaguez e da conversa, Larissa disse que estava hospedando uma poetiza carioca. Uma poetiza carioca? Sério? Barítono de Jim Morrison ecoa em minha cabeça.

“Porra, poetiza carioca dormindo às três da madrugada, quase nada, como cantou a Gal Costa?, sussurro, alto o suficiente pras minhas palavras encontrarem o ouvido da poetiza carioca.

“Baixou o Torquato no camarada”, diz Zé.

O papo abaixa o volume. Aparentemente, havíamos esquecidos da tal poeta carioca que, segundo Larissa, era jornalista e tinha escritos alguns livros em prosa e verso. Desejo que ela me ouça, que me ame e que me ache genial.

Naturalmente, começo a ficar bobo. A vodca e o fumo fazem efeito. Fico verborrágico, poético – mesmo sem conseguir soar brilhantemente lírico. Completamente ridículo, atesto. Zé me lança alguns olhares jocosos. Foda-se, o Zé. O cara é acostumado a falar até pelos cotovelos no bar.

Ouvimos um barulho que vinha do quarto de Larissa. Era a poetiza que se levantou. Ficamos em silêncio. Então, ela apareceu. Larissa disse:

“Te acordamos?”

“Não. Só quero ir ao banheiro”, diz.

Continuamos a conversa.

A poetiza passou por nós como se nem desse atenção.

“Vou dormir, gente”, avisa a aristocrata dos versos. “Amanhã a gente se fala. Tô morta de sono.”

Zé e eu nos olhamos boquiabertos.   

“Como é o nome dela?”, pergunto.

“Lua”, responde Larissa.

Que criatura estonteante.

Acordo com um martelo dentro de meu cérebro. O dia força a passagem pelas frestas da cortina. Rangido de talheres. Louça sendo lavada. Vozes estridentes. Burocratas em seus ternos. Pessoas conversando sobre suas vidas, seus compromissos. Caralho, hoje vai ser difícil sair da cama.

Vou ao banheiro. Jogo uma água na cara. Melhorou, um pouco. Acendi um cigarro, ao sentar no sofá.

Porra, a Lua.

Eu tinha de vê-la novamente.

Sentei em frente ao computador. Redigi uma crônica sobre Lua. Mandei pro jornal. Crônicas nascem da percepção do escritor. O cara tem de estar atento às coisas que ocorrem ao seu redor. Depois, é só sentar e o resto o teclado faz.

Um dia desses, eu estava contando pro Zé minha breve carreira de poeta. Estávamos no bar. Ele também escrevera poemas.

“Bicho, sinto que a tua escrita é um pouco aleatória”, me disse ele.

Pra isso servem os amigos, pra lhe apoiar nos momentos de fraqueza, pra lhe tirar da fossa.

“Cê tem jeito pra crônica. Eu queria ir pra crônica, mas acabei perdendo muito tempo com a academia. Aliás, ela não me deu nada, do ponto de vista erótico”, desabafou.

“Acho muito difícil alguém sentir tesão em você falando sobre os problemas sócio-políticos do terceiro mundo”, falei.

“Justamente, cara. Olhe pra mim. Falo pra caralho. Escrevi algumas teses. Tese é uma merda. Como diz o Chico, personagem de Tanto Faz, do Reinaldo Moraes: “Tese é a antítese do tesão.” Dificilmente uma mulher vai sentir tesão em saber que eu defendi uma tese sobre o neoliberalismo na vida dos imigrantes da Europa, após a saída do Reino Unido da União Europeia.”

Meneei a cabeça, concordando.

“Zé”, comecei. “Quando eu tinha dezesseis anos, eu andava escrevendo poemas. Tinha uns dois cadernos, cheios de escritos. Conheci uma moça, a Marina. A gente começou a ficar e tal. E eu escrevendo meus poemas...”

“Nessa época, cê comia alguém?”

“Não, cara. O máximo que rolava era um boquete de alguma puta. Eu tinha dezessete anos. Era 2012. Taí, Zé, o que cê fazia em 2012?“

“Tava começando a ganhar uma grana como fotógrafo. E o Corinthians havia ganhado a Libertadores e o Mundial.”

“Pois é. Aí, a Marina me traiu com outro filha da puta do colégio que estudávamos. O cara tinha uma pinta de viado, sabe?”

“Sei.”

“Deve ser por que ele tinha condições financeiras, né”.

“Provavelmente. Pense, Beck: o pai do cara dava tudo pra ele, incluindo um carro, aos dezessete anos! E você pobre, feio, corintiano e bêbado, que rabiscava uns poemas de amor no bar. É foda, bicho.”

Companheiro pra todas as horas, o Zé.

“Eu tava no Parada, boteco que funcionava no centro, perto da UEPG, colocando minhas lamúrias na ponta do papel, quando vi Marina entrar. Fiquei sem reação.”

Zé seguia concentrado na leitura de Diário de um jornalista bêbado. Nem estava prestando atenção no que eu falava. Desgraçado.

Mostrei-lhe meus poemas há uns dois anos. A gente estava bebendo e fumando um du-bão quando dei-lhe meu caderno. Zé leu alguns versos, e fraseou:

“Vai pra crônica, meu. Teu negócio não é poema. Já saquei essa tua ironia machadiana, esse teu deboche rodrigueano. Lembre-se: cê tem que ir pra crônica.”

No som, Monk´s dream, do pianista Thelonious Monk, tocava pela milésima vez. 

Abri os olhos. Primeira constatação do dia: eu existo, eu e as paredes. Elas me olham. Eu as olho. A gente tem uma invejável cumplicidade. Quando me sento em frente ao computador, pra escrever uma de minhas crônicas malucas, tenho-as como companheiras. Thomas Mann também as tinha. E Proust, Machado e todos os seus amiguinhos.

Tenho medo. Medo de chegar aos 50 sem mulher, sem amigos, sem dinheiro. Medo de enlouquecer, como Nietzsche. Estou com a cara mergulhada no ócio. Leio, escrevo, coço o saco e dou uma trepada. Vivo a vida de escritor, cujo maior trabalho fora um ensaio que falava sobre dinheiro. Intitulado de Dinheiro é uma merda, o texto ganhara a primeira página de um jornal. Fora uma pancada no puritanismo. Depois, eles mandaram-me um e-mail dizendo que minhas crônicas, com temática "bruta e linguagem chula", não seriam mais publicadas. Continuei a escrever dando bola e enxugando rum barato. E eles pararam de me publicar.

Tá foda. Não consigo colocar uma ideia no papel. São mil ideias em mente, deve ser por isso. Daí a coisa fica rondando minha psique. Eu deveria fazer como João Cabral de Melo, e encarar a vida sóbrio. Mas é foda. Minha ansiedade alivia quando enxugo uma garrafa de Nattu Nobiles e pito unzinho.

Olho pra garrafa de rum em minha frente. Penso em ir à cozinha e pegar um copo. Talvez eu consiga colocar a porra de alguma palavra no papel, sóbrio. É só sentar e escrever. Mais nada. Beck, cê só precisa pôr essa tua bunda na cadeira e escrever.

Minha crise alcoólica durou apenas alguns segundos. Como não havia motivos pra não beber, fui até a garrafa. Abri e dei um longo trago. Bolei um finório, fumei e quando estava suficientemente bêbado e chapado, sentei-me em frente ao computador e redigi uma carta lírica e desinibida pra Lua.

Essa solidão vai acabar me matando. Após dar um trago e fumar esse baseado, sinto meu coração disparar. Particularmente, prefiro quando ele faz seu trabalho sossegado. Tenho quase certeza de que vou acabar cardíaco, como meu avô. Ele nunca fumou essa merda de maconha, que parece mais ter um monte de esterco de vaca, junto desse rum vagabundo, de 15 paus.

Começo a concordar com Pascal. O homem só vai ter jeito quando souber controlar o seu quarto.

Agora destilo minhas loucuras. À noite, acharei algum bar pra beber com Zé. Ou ele aparecerá aqui em casa de madrugada com doses extravagantes de vinho e fumo na cabeça. Caso isso ocorra, terei de tocá-lo daqui. Ninguém é obrigado a aguentar um bêbado inconveniente. Zé é gente boa. Amigão. Contudo, quando enxuga uma garrafa de Montilla, torna-se o cara mais estranho do planeta. Bate na mesa. Crítica a desigualdade social. Discorre e ironiza a existência de Deus. Pede a prisão e a renúncia de Temer. Zé tem estilo. E, como Bukowski, sabe que o estilo “é a resposta pra tudo”.

seu jeito sedutor 
seu andar harmônico 
a forma com que segura o cigarro 
a forma com que fala com as pessoas 
Lua, cê é incrível

Encontrei-me com ela algumas vezes. Nelson Rodrigues tinha razão: Toda nudez precisa ser castigada. Imagine Lua andando por aí nua. Os velhinhos cairiam duros no ato. Lua despida fez meu coração bater freneticamente dentro do meu peito. Somando-se a isso, sua conversa me deixava preso sobre a mesa do bar. Nem me remexer na cadeira, eu conseguia. Fumava um cigarro atrás do outro. Se algum animal não ficar feliz com a companhia de Lua, filosofo, é porque a felicidade definitivamente não existe. Ela discorre sobre sua vida, sobre seu novo livro, sobre os poemas que está escrevendo. A cada sílaba que sai de sua boca, minha vontade de beijá-la aumenta. Eventualmente, eu esboço algum galanteio. Ela dá risadas. Mulheres com personalidade forte me atraem. Elas são donas de si. Sabem o que querem, e como querem. Diante de uma dama dessas, o cara tem de controlar seu fluxo de pensamento. Frases feitas, jamais. Chavões, nem pensar.

Lua é loucamente sublime.