Amigo que se comove com a luta
das mulheres, não podemos deixar barato quaisquer manifestações machistas.
Hoje, esta crônica não tem frescura – vou logo avisando. Vai direito ao ponto. Como
um murro – ou um texto de Virginia Wolf.
É dever do clube masculino, de
boa vontade e de caráter sólido, colocar-se no lugar das mulheres, que tem de
conviver com comentários esdrúxulos e triviais toda vez que saem de casa.
Mentalmente, tenho a leve impressão de que estamos no início do século XX.
Enquanto houver homens
patriarcais, a violência – em suas variadas formas – tende apenas a aumentar.
Nem falo de humanismo – esta ideia que me parece ultrapassada, sobretudo nestes
tempos árduos, de ódio mútuo e descarado. O máximo que espero é que a vida nos
dê chance de não piorarmos as coisas.
Pela manhã, ao abrir o site do EL
País, deparei-me com reportagem que alertava para um dado, no mínimo, preocupante:
a cada hora uma mulher é assassinada no Brasil. Somando-se a isso, a cada 11
minutos uma mulher é violentada. “Por eu ser mulher e sair na rua, os escrotos
(homens) me assediam, falando palavras chulas e pesadas”, desabafa uma amiga. “Dá
medo de olhar pra cara do filha da puta”.
E na Argentina? Não lembram? Pois
bem, vou lhes refrescar a memória: Irma Ferreyra foi empalada, em dezembro, e
não aguentou o ataque sexual. Pior: meses antes, a adolescente
Lúcia Perez, de 16 anos, foi drogada e empalada – uma vassoura fora introduzida
em seu ânus. A menina não suportou as dores e morreu.
Lá, uma mulher é assassinada a cada 30 horas por violência masculina. Após os episódios, porém,
as mulheres saíram às ruas e protestaram contra o silencio do governo de
Mauricio Macri.
Amiga de Irma, Mabel da Rocha descreveu
os últimos momentos dela. “Gritava de dor como um animal. Isso não vai sair
nunca. Tinha sangue no rosto, todo machucado. Eu lhe disse ‘Irma, eu te amo,
tenha força. Ela me disse ‘não aguento mais”, diz.
Será que por aqui é diferente,
amigo?
Um site de Goiânia, com milhares
de acessos, é famoso por assediar as estagiárias. Uma estudante de Jornalismo
da PUC, com medo de represálias, revelou que seu chefe lhe dizia absurdos que
pareciam terem vindos dos vídeos pornôs, que povoam a internet.
“O cara batia o pau nas minhas
costas, dizia que minha cara era fechada porque eu era mal comida”, revela. “Mas
o mais foda mesmo foi o dia em que eu estava indo embora, e ele entrou no meu
carro, tirou o pau pra fora e falou pra eu chupá-lo”, completa.
Psicologicamente abalada, a jovem tem medo de ingressar no mercado de trabalho. "Não sei o que pode acontecer... tenho medo, muito medo", conta.
Repetindo: milhares de pessoas
acessam o site... majoritariamente eleitores de Bolsonaro.
Infelizmente, eu não sei o que é
ser assediado por andar na rua. Sou privilegiado. Posso caminhar por aí, sem
camisa e vociferar palavrões em público. Está tudo certo, dentro dos padrões.
Posso gritar assistindo jogo do meu time, mas se uma mulher o fizer não
faltarão “piadas” que lhes atribuem especificações que nem vale a pena citar
neste espaço.
Agora, imagine uma mulher fazer
andar sem camiseta, com os seios de fora – como aconteceu em Goiânia, nesta
quarta-feira, 8, na Avenida Anhanguera.
Genial, não?
Ô gente machista da porra, ponham a mão no coração.
Nobríssimas, mulheres só me restam
homenageá-las nesta crônica mal escrita, que grita junto com seus corações ao
ouvir as idiotices de sempre.
A essa altura, o raciocínio, sei lá,
o léxico, a lógica foi para o beleléu, desculpa, amigo leitor.
Lamentavelmente, nada disso
funcionará se você chegar até aqui sem o mínimo de empatia e sem pensar no seu
dia-a-dia – e a relação de dominação que impõe na firma, quando chega a
estagiária novinha para trampar.
Pelo menos evoluímos. Pouco, mas
evoluímos: temos a Lei Maria da Penha, aprovada no governo Lula, em 2006. Ainda
é pouco, é claro. Falta muito para que as mulheres ocupem os mesmos espaços que
nós, com as mesmas condições. Mas um passo fora dado... há anos.
Sou péssimo com números. Foram dez anos?
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