domingo, 12 de fevereiro de 2017

País do futebol?


Argentinos discutem o futebol brasileiro
Dois jovens de aproximadamente 20 anos estão sentados, bebendo uma cerveja. Eles começaram juntos nas equipes de base do Boca Juniors. Bons de bola, facilmente chegaram à equipe principal. Por causa dos lances habilidosos choveram ofertas, mas permaneceram por mais um ano em Buenos Aires. No final da temporada, não se viram mais. Agora, dois anos depois, numa “tardecita” da capital argentina, eles conversam.

Um deles falava sem parar. Gesticulava e molhava a palavra com cevada, temperada por cigarros. Ele tinha retornado ao Brasil recentemente. Jogava numa grande equipe e contava ao amigo como eram as coisas por aqui. Falou dos estádios, às vezes sensacionais, como as arenas construídas para a Copa do Mundo, às vezes taperas, como as do interior do Brasil, mas que caracterizam e democratizam o futebol, com preços de ingressos acessíveis.

Complicado de se acreditar, mas o futebol no Brasil passou a ser coisa de rico. Uma arquibancada como as argentinas, com as torcidas gritando a plenos pulmões, como a do Boca Juniors, time em que começara a jogar, nem pensar. Tudo é muito confortável, parecendo shopping center cujas pessoas vão ver a tarde passar, e sequer sabem o que é um volante ou zagueiro. Verdadeiros torcedores de condomínio, assegurou o argentino.

Claro, havia violência entre torcidas, sobretudo as rivais, mas nada de outro mundo. Nada que supere um River e Boca. Falava-se disso dois, três dias, depois os jornais se calam. Afinal, quem vai ao estádio em carro blindado não têm quaisquer preocupações. É tudo fácil. Bem, ao menos para quem estaciona o automóvel na porta das arenas. Elite levando borboada? Não, não... A violência é coisa para ser revolvida entre a polícia e quem a enfrente, na base da porrada, de preferência.

As crônicas, disse o argentino ao amigo uruguaio, também deram lugar a comentários pífios de especialistas, que não sabem pôr uma vírgula sequer no texto. Não há Nelson Rodrigues e seus relatos poderosos. A subjetividade deu lugar a objetividade, fazendo com o que tio Nelson se revire na tumba, com os idiotas da objetividade.

O outro só ouvia, atentamente. Nem piscava os olhos, tamanha era a concentração. Como pode um país como o Brasil não revelar meio-campistas – logo eles que povoaram a meia cancha? Pelo menos o salário é bom, principalmente se o time que te amarrar um contrato generoso com algum patrocinador, que nada de braçadas em dinheiro.

Disso tudo o outro já sabia. Ouviu relatos de outros boleiros.

Mas, então, essa história do meio-campo é verdadeira? Sim, lá estão D´Alessandro, Conca, Montillo e, recentemente, até um venezuelano chegou, além de Borja, atacante que o Palmeiras foi à Colômbia para trazê-lo.

Abismado, o uruguaio ouvia tudo calado, lacônico. E, para completar, no ataque a coisa ia de mal a pior. É verdade que apareceu um garoto, Jesus, mas ele já foi vendido para a Inglaterra. Por isso eles nos procuraram, e não têm receios de gastar dinheiro, se vangloria o argentino.

E, agora, você não imagina, diz o hermano: o Brasil te dá visibilidade, e rapidamente surgirá ofertas da China ou Europa. Se você der certo, beleza. Se não, eles contratam do mesmo jeito.

“Te dás cuenta?”, pergunta o argentino que joga no Brasil.

“No, no entiendo”, responde.

“Yo tampoco, pero asi es en Brasil”, assegura.

“Que pais, che”, disse ele. “Vuelvo para alla mañana”.

Será que o Brasil ainda é o país do futebol?

Qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência

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