terça-feira, 10 de maio de 2016

Loirinha rodrigueana

Nelson Rodrigues falou e tá falado: “Não tem para ninguém, barbada, meu filho, ninguém representa a ideia de pecado e liberdade ao mesmo tempo como essa minha Engraçadinha”.

E não mesmo. Um dia desses, entre xingamentos e contestações urbano burguesa, veio-me à mente a imagem dela. Loira, shortinho azul polaco curto, pernas branquinhas, rosto lascivo. Uma loucura, amigo leitor.

Pode acontecer tudo nessa vida maluca e desvairada. Contudo, pouca coisa é melhor do que amar. Ah, como é bom aquele cheiro de mulher. Aquelas mãos leves e macias. Aquele sorriso sedutor e conquistador.

Sábio velho safado. Não o Bukowski. E sim Henry Miller – o cara que escrevera a trilogia de sacanagem filosófica/existencial, A crucificação encarnada. Livrão, cara. Já o li e reli umas duzentas vezes. Mestre Miller andara pelas ruas de Nova Iorque recheado de indagações sobre a vida, mas com dois propósitos em mente: amor e buceta.

Oh, que vestidinho! Outro dia, cheguei bêbado às duas da madrugada. Dei de cara com ela, acredita? Tive de dar aquele sorriso etílico de boêmio invertebrado. Pra minha sorte, ela retribuiu-me a gentileza e abrira a boquinha, expressando um maravilhoso e belo cumprimento entre dois vizinhos estranhos.

“Obrigada”, agradeceu, quando abri a porta, dando-lhe a passagem.

“Não há de quê”, falei, com minha fala arrastada pela birita.

Bbrrrzzzz.... “Você é o meu ponto fraaaccccoooooo, por que não?”.

Ao chegar em casa, liguei um BB King – rei do blues e uma trilha sonora excepcional pruma foda. O som deu-me uma vontade de amar, de deliciar-me no sexo feminino e carinhoso. A birita deixa-nos aturdidos. Quando bebe-se, algo acontece. Sábio velho Buk – o cafajestão da literatura.

Diga sim à vida. Diga sim ao amor. Diga sim à embriaguez, ao sexo, à arte. Lembrei-me de Nietzsche. E, depois, de Morrison – o vocalista do The Doors, a banda mais louca da história do rock.

Trocamos pouquíssimos olhares, naquela noite. Fui pra casa. E curti o término de meu porre sozinho. Ela deveria estar em sua casa, cuidando de seu filho – sim, ela tem um filho -, enquanto eu penso em algumas linhas trôpegas. Clap-clap, penso em algumas linhas! Ninguém as lê! Acho que nem o pessoal deste jornal as lê.

Um dia desses, acho que ontem, ela passou com um carrinho de bebê. Que coisa linda. Uma mulher com bebê representa e simboliza o amor materno – aquele que o doidão do Freud disse que é a primeira atração pelo sexo oposto que sentimos.

Eu fumava meu último Minister. E pensava nas crônicas de Xico Sá e em sua definição de estria e celulite. “Homem que é homem não sabe a diferença entre estria e celulite”, escreveu. E se eu te contar que ela não tem estria, nem celulite, ou qualquer coisa? Eu também não sei diferenciar essa porra. Mas foda-se: ela é uma coisinha de louco. Ela lembrou-me de Judite, Vera Fischer, em Perdoe-me por me traíres, filme dirigido Braz Chediak, baseado na peça do Nelsão.

Até o porteiro de meu condomínio a acha lasciva. Fui pedir um cigarro pra ele, e ela estava na portaria, com seu filho. Cheguei, todo desengonçado, tentando parecer simpático, pra conversar e brincar com a criança. Falei alguma coisa, mas nem a criança, nem a mãe, nem o porteiro entenderam. Tive de abrir uma feição descontraída. Tive de forçar, ali, uma situação qualquer pra não dar uma de otário. De qualquer forma, acho que não deu.

Ela foi embora, com seu filho no cangote.

“Tem um cigarro pra me arrumar, vey?”, perguntei ao porteiro.

“Na hora”, respondeu.

“Que gata, né?”, indagou.

Acendi o pito. Vi a fumaça subir pelo céu, e respondi:

“Pra caralho.”

“Literalmente”, brincou.

Forcei um riso, e conclui:

“O dia fica até mais claro, ao vê-la.”

Pelo visto Rodrigo não tinha entendido o sentido da colocação.

“Vou indo nessa, meu”, falei.

“Falou.”

Virei às costas.

Que gata! Que linda! Que vontade de abraçá-la. Que vontade de cuidar dela e do filho e da mãe e de 
sua família toda!

Ela, cujo nome ainda não descobri, tem a maldade, a sacanagem, a perversão nas pupilas. Taí, talvez sacanagem na pupila lhe seja a característica mais atrativa. Ou magnética, como cantou Jorge Ben Jor. Ela dá uma risadinha tímida pras pessoas. Uma garota tipicamente do interior, que vive na capital de Goiás.

Nela, encontro uma pitada rodriguena. Ela é tesuda. Claro que por não ser científica, minha pesquisa apontou que todos, nos bares por aí, preferem as loirinhas novinhas. Sinto que não devo reproduzir neste espaço o conhecidíssimo vexame onomatopeico dos homens diante da gostosinha-mor dessa caceta.

Trimmmmmmm.... era ela. Atendi:

“Ãn...”

“O que tá fazendo?”, ela quis saber.

“O de sempre”, respondi.

“Tá bêbado, né?”

“Um pouco.”

“Te ligo depois.”

“Beleza”.

Deixarei pra respondê-la depois desta crônica etílica, tarada, lisérgica, fumada e pirada.

Que loirinha tesuda.

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